terça-feira, 21 de março de 2017

ETERNIT DO RIO DE JANEIRO CONDENADA A SUBSTITUIR O AMIANTO EM 18 MESES

PROCESSO 0011104-96.2014.5.01.0049
S E N T E N Ç A (na íntegra)

I- RELATÓRIO
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - Procuradoria Regional do Trabalho/1ª Região, devidamente qualificado nos autos, ajuizou a presente Ação Civil Pública em face de ETERNIT S.A., também devidamente qualificada, formulando os pedidos definitivos constantes na inicial (ID 20da5d6), bem como pedidos liminares, com amparo inclusive no Inquérito Civil n°003512.2008.01.000/3 instaurado em março de 2013, que tramitou na Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região.
Petição de ID 969e1e8 com requerimento do Ministério Público do Trabalho de juntada de documentos físicos em cartório, conforme art. 11, §5º, da Lei nº 11.419/2006 e art. 19, §4º, da Resolução CSJT nº 136/2014, o que foi deferido, nos termos da decisão de ID 51eee2c.
Após o recebimento da inicial, o autor aditou a inicial, excluindo o pedido item "5" da liminar, mas mantendo os pedidos subsequentes 5.1 a 5.11. (petição de ID a340174).
Em 04/09/2014, realizada audiência de conciliação, o feito foi retirado de pauta por 60 dias, prazo posteriormente prorrogado, a requerimento das partes, até primeiro de dezembro de 2014.
Em 28/11/2014, o autor peticionou, id 8ca0ccc, requerendo a homologação de acordo parcial.
Em 05/12/2014, o réu manifestou-se no sentido de concordar com o acordo de ID 6acdaa3 apresentado pelo Ministério Público.
Em 11/12/2014, este Juízo homologou o acordo parcial de ID 8ca0ccc, através da decisão de ID aeb6777extinguindo os pedidos liminares de números 1, 2, 3, 4, 5.3, 5.4, 5.5, 5.6, 5.7, 5.8, 5.9, 5.10, 5.11, 6, 7, 8, 9, 10, 11 a 28, 30 e 34bem como os pedidos definitivos de números 1, 2, 3, 4, 6,3, 6.4, 6.5, 6.6, 6.7, 6.8, 6.9, 6.10, 6.11, 7 a 29, 31 e 35, com resolução do mérito, diante da homologação do acordo parcial,o que se reitera, de modo a se extinguir com resolução do mérito todos os citados pedidos liminares e definitivos supra mencionados.
Além disso, em decisão proferida em 11/12/2014, foram analisados os pedidos liminares remanescentes, tendo sido deferidos liminarmente os pedidos 5.1, 5.2, 32, 33 e 35.
Por outro lado, foi indeferida a liminar do pedido 29, diante da constatação de que o autor não informou quais seriam os exames pretendidos. Indeferida também a liminar quanto ao pedido 31 e seus subitens, por ter sido considerado que as divulgações pretendidas pelo autor são decorrentes "de condenação judicial", o que ainda não ocorreu na presente ação.
Foi fixado prazo para cumprimento de 90 dias, mantidas as penas cominatórias para o descumprimento, conforme pedidos liminares deferidos e designada nova audiência para o dia 12/03/2015.
A Eternit S/A ingressou com pedido de reconsideração da liminar deferida nos itens 5.1, 5.2, 32, 33 e 35, argumentando que a Justiça do Trabalho não poderia apreciar a licitude ou ilicitude de uso do mineral amianto crisotila como matéria-prima (id a28c69b), bem como posteriormente Embargos de Declaração (id 20aaa84).
pedido de reconsideração foi indeferido, sendo mantida a liminar por seus próprios fundamentos, conforme decisão de ID b7dd998.
Os embargos de declaração foram acolhidos em parte, para esclarecer que, em relação aos pedidos 33 e 35, a ré deve observar como ATUAIS empregados o número total de empregados em 31/12/2014, com as alterações posteriores e ex-empregados serão considerados aqueles desde 01/06/1995. (decisão de ID 616b134).
Ambas as decisões foram objeto de irresignação da reclamada, por meio da petição apresentada no ID 6a4dd39.
Em 12/02/2015, foi recebido na Secretaria telegrama do Superior Tribunal de Justiça, informando odeferimento de liminar na Reclamação n° 23212/RJ(2015/0020717-7), suspendendo os efeitos da liminar deferida especificamente nos itens 33 e 35 do id 616b134. (documento ID ae2defd).
Em 19/02/2015, foram prestadas informações ao STJ na referida Reclamação - ID 05e4e07.
Em 26/02/2015 foi impetrado Mandado de Segurança nº 0010203-47.2015.5.01.0000 pela Eternit S/A - ID 93825da - com informações prestadas por este Juízo (ID 3b30a24), em que foi deferida em parte a liminar (decisão ID a01dc05). Em 20/08/2015, foi concedida, em definitivo, a segurançapara confirmar os efeitos da decisão que deferiu parcialmente a liminar para reduzir os valores impostos a título de multa nos itens 5.1, 5.2 e 32 da decisão que antecipou em parte os efeitos da tutela na presente ação civil pública nº 0011104-96.2014.5.01.0049 ao importe de R$30.000,00 pelo descumprimento de qualquer uma das obrigações de fazer ajustadas, em cada constatação de descumprimento, dobrada em caso de reincidência e para que só sejam paralisadas as atividades do setor da empresa em que ocorrer a extrapolação do limite de 0,1 f/cm³ de concentração de fibras de amianto, quando constatado que o excesso não se deu de forma eventual.
Contestação, com documentos, apresentada pela reclamada (ID 5a4d999).
Em 12/03/2015, foi realizada audiência, na qual, recusada a conciliação, foram recebidos contestação e documentos e rejeitada a preliminar de inépcia.Foi deferido o prazo de 60 dias para a parte autora se manifestar sobre preliminares, defesa e documentos, sob as penas do art. 372 do CPC, e fixado que, nos 10 dias subsequentes, o réu deveria se manifestar sobre as provas que pretenderia produzir.
Em 11/5/2015, o MPT apresentou réplica, nos termos da petição de ID fd52ba0.
Após, em 21/05/2015, a Eternit S/A peticionou requerendo a produção de provas, inclusive pericial, aduzindo outras manifestações - ID a5aa942.
Manifestações do Ministério Público do Trabalho na petição de ID 211255a, sustentando ser desnecessária a realização de prova pericial.
Decisão de ID 3f65a6fpela qual foram rejeitadas as preliminares arguidas pela reclamadaquanto à incompetência da Justiça do Trabalho, litispendência quanto ao pedido de indenização por danos morais coletivos, ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para pleitear medidas de cunho econômico, ausência de interesse processual, impossibilidade jurídica do pedido e inépcia da petição inicial. Foi indeferido também o desentranhamento dos documentos em língua estrangeira e o sobrestamento do feito. Quanto às provas, a citada decisão indeferiu a realização de prova pericial técnica, nos termos do art. 765 CLT c/c 130 e 420 CPC.
Inconformada, a empresa Eternit S/A consignou sua irresignação na petição de ID f898fe1.
A reclamada apresentou a Correição Parcial n°0006746-07.2015.5.01.0000, que foi julgada improcedente. (ID b25720e).
Petições apresentadas pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Industrias de Olaria e Cerâmica para Construção do Cimento, Cal e Gesso e de Artefatos de Cimento Armado do Município do Rio de Janeiro e pelo STIEBEMGOR - Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas e Beneficiamento de Minaçu/GO e Região (ID 27bad22 e ID f5aec64, respectivamente), tendo ambos os sindicatos pretendido a intervenção no processo na qualidade de amici curiae.
Audiência realizada em 23/09/2015 (ID b94042e), em que a reclamada propôs uma composição parcial no que diz respeito ao item 32 do rol de pedidos liminares, correspondente ao item 33 dos requerimentos definitivos e em relação aos itens 5.1 e 5.2 do rol de pedidos liminares e 6.1 e 6.2 dos requerimentos definitivos, além do pedido de reconsideração do despacho que indeferiu a prova técnica. Em tal assentada, foi deferido prazo de 10 dias para autor e réu manifestarem-se sobre o requerimento dos dois sindicatos.
Impugnação à ata de audiência (ID 847173), pela Ré, a qual também fez pedido de reconsideração da decisão que indeferiu a realização de prova pericial (ID 4eb91da) e se manifestou sobre a concordância do ingresso dos Sindicatos na qualidade de amici curiae (ID 7b6a94f).
Manifestação do Ministério Público (ID a58df56), requerendo o indeferimento do ingresso dos Sindicatos como amici curiae, bem como oindeferimento da produção de prova pericial e documental.
Decisão de ID 252e8fa, rejeitando a impugnação da ata de audiência e deferindo o ingresso dos sindicatos como amici curiaeestabelecendo os parâmetros de sua atuação como tal, commanutenção da decisão anterior que indeferiu a produção de prova pericial, nos termos do art. 765 CLT c/c 130 e 420 CPC.
Manifestação da reclamada sobre as tratativas de acordo, com renovação dos seus protestos quanto ao indeferimento da realização da prova pericial (ID 3e4e14d).
Expedida carta precatória inquiritória, conforme certidão de ID a5b9985, a qual foi devolvida, devidamente cumprida, com oitiva de uma testemunha,nos termos da cópia de ata de audiência de ID 8a9e7c3.
Despacho de ID 45ab0f7, reincluindo o feito em pauta de instrução para o dia 02/08/2016.
Documentos apresentados pela parte autora (ID c1ae7d2), sobre os quais se manifestaram o STIEBEMGOR - Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas e Beneficiamento de Minaçu/GO e Região, a reclamada (Eternit S/A) e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Olaria e Cerâmica para Construção do Cimento, Cal e Gesso e de Artefatos de Cimento Armado do Município do Rio de Janeiro, respectivamente nos ID's 3c80e7e, 26e6dc5 e d9b70de.
Em razão possibilidade de conciliação, a audiência realizada no dia 02/08/2016 foi adiada para o dia 29/09/2016, nos termos da ata de ID 62a3e61.
Audiência de instrução realizada em 29/09/2016 (ID 341b3c8), em que foi colhido o depoimento pessoal do preposto do réu e de uma testemunha.
Nova audiência no dia 24/11/2016 para uma nova proposta de conciliação.
Manifestação da reclamada, renovando sua proposta conciliatória (id eab60ad), mas infrutífera.
Razões finais escritas apresentadas pela parte autora (ID b0ce69f), pela reclamada (ID 8ae45fc) e pelo STIEBEMGOR - Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas e Beneficiamento de Minaçu/GO e Região (ID 3913a98).
Frustrada a última tentativa conciliatória, nos termos da ata de audiência de ID 6e8883d.
É este, em síntese, o relatório.
II- FUNDAMENTAÇÃO
Embora já apreciadas, em sua maioria, tendo em vista o requerimento empresarial de reapreciação das preliminares, a fim de evitar embargos de declaração de cunho absolutamente protelatório, passo ao exame, especialmente por dizerem respeito a matérias de ordem pública, que podem ser reanalisadas a qualquer tempo, inclusive de ofício.

INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO
Não há dúvidas de que a presente ação tem seus pedidos centrados no meio ambiente de trabalho, inclusive o de substituição do amianto.
Logo, a competência desta Especializada decorre da incidência do art. 114, I e VI, da CR/88.
Exegese da Súmula 736 do STF e da própria ratio da Súmula Vinculante 22/STF.
A origem das normas se de direito civil, minerário ou trabalhista a serem usadas para a apreciação dos pedidos não tem relevância para o exame da competência, que, frise-se, decorre no caso de questões afetas ao Meio Ambiente de Trabalho.
Rejeito.

LITISPENDÊNCIA
O processo ajuizado pelo MPT em face da Ré no âmbito do TRT-2 diz respeito exclusivamente à fábrica existente em Osasco-SP (e cujas atividades já se encerraram há anos), ao passo que o presente fulcra-se em pedidos relacionados à fábrica de Guadalupe no Rio de Janeiro.
Assim, mesmo que haja pedidos semelhantes, a causa de pedir é absolutamente diversa, não havendo cogitar de litispendência.
Rejeito.

INTEGRAÇÃO À LIDE DA UNIÃO FEDERAL E DNPM
A matéria veiculada neste feito não afeta interesses jurídicos da União Federal, tampouco do Departamento Nacional de Produção Mineral, pois diz respeito exclusivamente a questões do ambiente laboral da fábrica da Ré situada no Estado do Rio de Janeiro.
Aliás, nem mesmo há, portanto, cogitar de qualquer aplicação do Código Minerário ou do Direito Minerário à hipótese, pois os pedidos da inicial dizem respeito à fábrica da Ré em Guadalupe e não a qualquer lavra que ela explora.
Rejeito.

INÉPCIA
A inicial não padece de nenhum vício, tendo sido clara e fundamentada, inclusive em relação aos pedidos de indenização por danos morais, bem como seu valor, e substituição do uso do amianto.
Assim, não há dúvidas quanto à aptidão da inicial, que obedeceu todos os ditames impostos na processualística civil-trabalhista.
Aliás, é plenamente possível a cumulação de pedidos em Ação Civil Pública, por decorrência lógica do art. 5º, XXXV, da CR/88, sendo essa a melhor interpretação do art. 3º da Lei 7.347/85.
Rejeito.

AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO
A Reclamação 23.212/RJ do STJ, embora apenas tenha tido sua liminar apreciada, não obsta o prosseguimento do feito, pois ela apenas determinou, especialmente quanto aos itens 33 e 35 da liminar anteriormente concedida na presente Ação Civil Pública, que: "até o julgamento final da presente reclamação, suspender parcialmente a liminar deferida nos autos da Ação Civil Pública n.º 0011101-96.5.01.0049, em trâmite perante a 49ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, notadamente quanto aos itens 33 e 35" (ID 616b134)".
Extrai-se disso que a decisão liminar proferida na Reclamação supracitada foi clara ao determinar apenas a suspensão da liminar deferida nos autos desta demanda, o que não obsta em nada o regular prosseguimento do feito, após o encerramento da instrução, não havendo cogitar de descumprimento por este Juízo de tal liminar, pois ela de fato teve seus efeitos sustados, exatamente como determinado pelo STJ.
Em outros termos, presentes todos os pressupostos processuais necessários para o exame de toda a ação.
Rejeito.

ILEGITIMIDADE DO MPT
A legitimidade ativa do MPT decorre da interpretação conjunta do artigo 129, III, da CR/88; arts. 1º,caput, I e IV, e 5º, I, da Lei 7.347/85; arts. 81 e 82, I, do CDC; e arts. 6º, VII, e 83, III, da LC 75/93, o que abrange, obviamente, inclusive o cunho econômico advindo do pedido de compensação/indenização pelos danos morais coletivos.
Rejeito.

INTERESSE PROCESSUAL
O autor ajuizou ação adequada à tutela jurisdicional que vindicou, tendo a ré resistido à sua pretensão, o que evidencia a utilidade, necessidade e adequação da presente demanda aos pedidos formulados, inclusive atinentes à observância dos limites normativos estabelecidos para exposição do amianto, bem como ao pedido de eventual disponibilidade dos dados dos seus empregados e ex-empregados, além também do pleito referente à eventual necessidade de interdição da fábrica da Ré situada nesta Capital, pois a competência fiscalizatória inerente ao Ministério do Trabalho não se confunde e não afeta o livre acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV, da CR/88).
As questões trazidas pela Ré, como preliminar, na realidade, dizem respeito ao mérito e ali serão prontamente apreciadas.
Rejeito.

IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO
O pedido do MPT referente à substituição da matéria-prima amianto não encontra nenhuma vedação no ordenamento jurídico pátrio, seja expressa ou implicitamente, detendo substrato jurídico, na forma aduzida na inicial, em diversos dispositivos de base legal, convencional e constitucional, o que faz com que todo o mais seja questão de mérito a ser oportunamente resolvida.
Rejeito.

SOBRESTAMENTO DO PROCESSO
O mero fato de haver discussão sobre o tema principal dessa demanda pendente de apreciação no STF ou em outros Tribunais, mesmo que em ações diretas de inconstitucionalidade, não gera o pretendido sobrestamento, máxime quando não houve determinação em sentido contrário da Suprema Corte ou de qualquer outra Corte Superior.
Ora, sobrestar o presente processo pela simples existência de ações diversas pendentes de apreciação por outros Tribunais seria ir de encontro à duração razoável do processo, princípio consagrado como fundamental pela CR/88 (art. 5º, LXXVIII).
Rejeito.

IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA
O valor da causa encontra-se plenamente compatível com o conteúdo econômico dos pedidos realizados, não havendo, portanto, cogitar de alteração.
Com efeito, o pedido de indenização pelos danos morais coletivos já foi fixado na própria inicial como sendo de R$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de reais), de maneira que o valor da causa deve sim observar tal patamar por corolário.
Rejeito.

PERÍCIA TÉCNICA
A Ré reitera a necessidade de realização de perícia técnica, na forma do art. 195, §2º, da CLT, para verificação e comprovação de que sempre observou os limites e normas relativas ao uso do amianto.
Contudo, a prova pericial pretendida pela Ré, no caso dos autos, se mostra absolutamente desnecessária, por vários motivos.
O primeiro de todos é que tal perícia só provaria a atual situação da sua fábrica, em nada afetando as constatações anteriores e pretéritas feitas pela Comissão de Fábrica que foi constituída na própria empresa com base na Lei 9.055/95 e cujas atas e relatórios foram juntados pelo MPT e nem mesmo foram objeto de impugnação específica quanto ao conteúdo na defesa, considerando-os, portanto, verdadeiros.
A segunda razão é que a tese principal do MPT é a de que não há possibilidade de uso seguro do amianto, o que tornaria irrelevante o suposto respeito aos limites estabelecidos normativamente.
Mesmo o pedido sucessivo de observância do limite de 0,10 f/cm³ fixado no Acordo Nacional tem como premissa o descumprimento anterior desse fato, ou seja, a sustentação pela inicial de já existência de ilícito pretérito, para o que a reparação posterior do ilícito (que a Ré pretende provar com tal perícia) em nada altera os contornos da lide.
Outrossim, a própria testemunha Elitom Vagner, ouvida a rogo da Ré, elucidou que "quem faz as medições do uso do amianto é uma outra empresa de nome PROJECONTROL, que é a única no mercado que é cadastrada de acordo com as normas do INMETRO previstas na NR 15". E nesse aspecto, a Ré juntou aos autos diversas medições realizadas por tal empresa, além de também ter juntado outros tantos laudos periciais colhidos em diferentes momentos e inclusive vários processos judiciais, como prova emprestada, o que só vem a reforçar a total desnecessidade de se produzir nova perícia.
Aliás, a testemunha Elitom Vagner ainda mencionou, em seu depoimento, a extrapolação do índice fixado no Acordo Nacional em uma ocasião recente, elucidando que "houve uma medição há cerca de dois anos cujo índice foi de 0,13f/cm³, não se recordando de mais nenhuma diferente dessas já mencionadas; que existe um prazo de trinta dias para que sejam tomadas medidas corretivas em casos em que o limite do índice é ultrapassado, mas no caso que mencionou acima não sabe dizer quais foram as medidas corretivas tomadas", merecendo ênfase que o próprio MPT confirma seja na inicial, seja pela documentação juntada, que, em todas as vezes que as medições ultrapassaram os limites normativos, a Ré observou com tranquilidade o prazo de 30 dias fixados no Acordo Nacional para regularização e correção dos problemas, mas fato é que o objeto pretendido neste feito difere em muito do pleito protelatório de realização de prova pericial tão exaustivamente requerido pela Ré.
Assim, após o decorrer da instrução, fica ainda mais patente a desnecessidade de produção da prova pericial requerida pela Ré.
Indefiro, nos termos dos arts. 765 da CLT e 370, parágrafo único, do CPC-15 (art. 130/CPC-73).

IMPUGNAÇÃO AOS DOCUMENTOS EM LÍNGUA ESTRANGEIRA - EXCLUSÃO - RISCAR EXPRESSÃO DOS AUTOS
Inicialmente, apenas as expressões injuriosas e ofensivas possuem a sanção de serem riscadas dos escritos produzidos nos autos, mas não aquelas escritas em língua estrangeira, diante do que não há nada a ser riscado nas peças processuais, independentemente da língua utilizada.
A mais que isso, os documentos impugnados pela Ré, por não terem sido objeto de tradução juramentada, podem, atualmente, ser facilmente objeto de tradução, inclusive de modo virtual.
Ora, o processo moderno já é eletrônico, ou seja, tramita de modo virtual, e a internet fornece diversos e inúmeros tradutores instantâneos com fácil acesso a todos, inclusive pelos conhecidos programas de busca.
Aliás, não há nulidade sem prejuízo, de modo que a mera alegação de vício formal genérica de ausência de tradução juramentada não gera imediatamente a exclusão pretendida, ainda mais quando a Ré não trouxe nenhuma efetiva dificuldade na tradução de tais documentos e inclusive confirma ter conhecimento de vários deles, como p.ex., quando afirma que a Sentença de Turim (um dos documentos juntados em língua estrangeira) foi objeto de reforma pela Corte de Cassação Italiana. Outrossim, a própria Ré traz documentos em língua estrangeira confirmando a plena possibilidade de acesso àqueles documentos e escritos trazidos com a inicial.
Além disso, percebe-se que tais documentos, na verdade, são referentes a fatos públicos e notórios no âmbito internacional, o que só reforça a possibilidade de permanecerem nos autos.
Por derradeiro, percebe-se que a Ré, no mais, não chegou a impugnar nenhum outro documento trazido pelo Autor, o que confirma a validade e veracidade de todos eles.
Rejeito.

INQUÉRITO CIVIL - CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA
As provas colhidas em inquérito civil gozam de presunção de veracidade, por serem documentos públicos (art. 405/CPC-15, antigo art. 364 do CPC/73), cabendo à Ré a contraprova para eventualmente demonstrar situação diversa das provas então colhidas pelo MPT.
O suposto vício aos princípios do contraditório e da ampla defesa quanto à fase de inquérito e de produção de tais documentos não vinga, pois tais garantias foram totalmente asseguradas no presente processo na fase judicial, tanto que a Ré apresentou diversos documentos, - inclusive de perícias técnicas e judiciais feitas em sua fábrica de Guadalupe, utilizadas como prova emprestada - e oral - com oitiva de duas testemunhas, uma por carta precatória -, mas, como já salientado no tópico anterior, nem mesmo assim chegou a impugnar especificamente nenhum outro documento que não aqueles em língua estrangeira, cuja impugnação já foi rejeitada no tópico anterior.
No mesmo sentido é o entendimento tanto do STJ, quanto do TST, in verbis:
PROCESSO CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INQUÉRITO CIVIL: VALOR PROBATÓRIO. 1. O inquérito civil público é procedimento facultativo que visa colher elementos probatórios e informações para o ajuizamento de ação civil pública. 2. As provas colhidas no inquérito têm valor probatório relativo, porque colhidas sem a observância do contraditório, mas só devem ser afastadas quando há contraprova de hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do contraditório. 3. A prova colhida inquisitorialmente não se afasta por mera negativa, cabendo ao juiz, no seu livre convencimento, sopesá-las, observando as regras processuais pertinentes à distribuição do ônus da prova. 4. Recurso especial provido. (REsp 849.841/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/08/2007, DJ 11/09/2007, p. 216)
RECURSO DE REVISTA. 1. NULIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Não observado o disposto na OJ 115 da SBDI-1 desta Corte, desmerece análise o apelo. Recurso de revista não conhecido. 2. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. O MPT detém legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos, nos exatos limites dos arts. 127 e 129, III e IX, da Constituição Federal, 6º, VII, alíneas -a- e -d- e 84 da Lei Complementar nº 75/93. Recurso de revista não conhecido. 3. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. VALIDADE DAS PROVAS. CERCEAMENTO DE DEFESA. VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. As peças de inquérito civil público, promovido pelo Ministério Público do Trabalho, desfrutam de valor probante e, sem elementos que contradigam os fatos neles descritos, não podem ser ignorados como meios de prova. Sua utilização em Juízo não ensejará cerceamento de defesa ou violação do devido processo legal. Recurso de revista não conhecido. (...). ( RR - 9891400-77.2006.5.09.0015 , Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Data de Julgamento: 25/08/2010, 3ª Turma, Data de Publicação: 03/09/2010)
RECURSO DE REVISTA. 1. NULIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Deixa-se de examinar a preliminar, com base no art. 249, § 2º, do CPC. 2. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. LAUDO DE INSPEÇÃO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO. MEIO DE PROVA. VALIDADE. À luz do disposto no art. 364 do CPC, os documentos públicos gozam de presunção de legitimidade e somente podem ser desconstituídos por meio de contraprova produzida pela parte adversa, não bastando para tanto, a singela impugnação. O laudo de inspeção do Ministério do Trabalho e as peças de inquérito civil público, promovido pelo Ministério Público do Trabalho, desfrutam de valor probante e, sem elementos que contradigam os fatos neles descritos, não podem ser ignorados como meios de prova. Recurso de revista conhecido e provido. (ED-RR - 57600-73.2005.5.03.0105 , Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Data de Julgamento: 24/06/2009, 3ª Turma, Data de Publicação: 14/08/2009)
Rejeito.

SUBSTITUIÇÃO DO AMIANTO
O amianto, mais conhecido como asbesto, é uma forma fibrosa dos silicatos minerais, dividindo-se em dois grandes grupos: serpentinas ou crisotila (asbesto branco) e anfibólios ou acinolita, amosita (asbesto marrom), antofilita, crocidolita (asbesto azul), tremolita ou qualquer mistura que contenha um ou vários destes minerais.
Ele tem origem mineral e deriva de rochas metamórficas eruptivas, transformando-se, por processo natural de recristalização, em material fibroso. As suas fibras são flexíveis e não se dissolvem em água e resistem a altas temperaturas (e mesmo ao fogo) e à degradação por produtos químicos e biológicos, assegurando isolamento térmico, acústico, incombustibilidade, resistência mecânica e durabilidade (Vide Estudos do INCA - Anexo 1 - Doc. 3 - f. 96).
Inicialmente, o amianto era utilizado no reforço de utensílios de cerâmica, mas posteriormente à Revolução Industrial passou a ser usado como isolante térmico de máquinas e equipamentos e atualmente permanece sendo utilizado em materiais de construção civil no fibrocimento.
Matéria-prima de baixo custo, o amianto foi considerado o "mineral mágico" por muitos anos e foi muito utilizado especialmente no Séc. XX, mas depois de estudos mais aprofundados passou a ser chamado de "poeira assassina".
O artigo do Professor René Mendes (Anexo 1 - Doc. 1 - f. 13-v/15), publicado em março de 2000, confirma que os primeiros estudos publicados sobre o amianto e suas consequências graves à saúde humana datam de 1907, ano em que o inglês Montagne Murray descreveu a asbestose, doença responsável pela morte de um trabalhador exposto ao asbesto em atividades de fiação, cuja comprovação decorreu da necrópsia, que revelou a presença de extensas áreas cicatriciais nos pulmões desse obreiro. Tais descrições sucederam-se nas décadas seguintes no Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha, França, Itália e Canadá.
Mas foi apenas W. E. Cooke que, em 1924, estabeleceu a correlação entre a ocupação do trabalhador, o seu quadro clínico e os achados da necrópsia, cuja doença denominou à época defibrose pulmonar, a qual posteriormente passou a ser conhecida como asbestose. Já em 1935, S. R. Gloyne, patologista britânico, descreveu o potencial carcinogênico do asbesto. Os estudos sobre o tema prosseguiram até que Richard Doll, em 1955, definitivamente, estabelecesse a associação causal entre a exposição ao asbesto e o câncer de pulmão.
Desde então, os estudos sobre os efeitos do asbesto na saúde humana só se intensificaram, inclusive no Brasil a partir sobretudo da década de 1950, tendo a ciência médica confirmado também a forte associação causal entre a mesotelioma de pleura ou peritônio e a exposição pregressa ao asbesto, mesmo após curtas exposições ou de exposições em baixas doses, citando casos em que houve grande latência de mais de 30 anos entre o momento de exposição ao asbesto e os primeiros sintomas ou sinais da doença.
Essa latência de algumas décadas para aparecimento dos primeiros sintomas das doenças relacionadas ao asbesto se confirma em vários outros estudos científicos, como se percebe nos documentos 1, 2, 3 e 4 jungidos à inicial (todos no anexo 1).
Outras neoplasias malignas já tem sido associadas à exposição ao asbesto, citando o professor Rene Mendes os casos de câncer de laringe e de estômago, dentre outros(Anexo 1 - Doc. 1 - f. 13-v/15).
O amianto é substância de comprovado potencial cancerígeno em quaisquer de seus tipos, formas ou estágios de produção, transformação e uso, tendo a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhecido que a crisotila está relacionada a diversas formas de doença pulmonar, tais como asbestose, câncer pulmonar e mesotelioma de pleura e de peritônio, elucidando, ainda, a OMS, por meio dos estudos que redundaram no seu Critério 203, publicado em 1998, que não há nenhum limite seguro de exposição a tal substância (INCA - Anexo 1 - Doc. 3 - f. 96-v/98).
Atentos a isso, como é fato notório, mais de 50 países passaram a banir o uso de amianto, alguns ainda em meados da década de 1980 (Suécia, Suíça, Dinamarca, Cingapura, Noruega, Islândia), outros na década de 1990 (Alemanha, França, Itália, Áustria, Bélgica, Reino Unido, Kuwait, Polônia, Arábia Saudita, Holanda) e outros, mais recentemente, já nos anos 2000 (África do Sul, Espanha, Eslováquia, Chile, Argentina, Uruguai, Grécia, Japão, Nova Zelândia), destacando-se aqueles oriundos da Europa, Àfrica e alguns da América do Sul, no particular.
No Brasil, o asbesto é explorado comercialmente desde a década de 1940, mesma época de início das atividades da fábrica da Ré nesta Capital, conforme declarado pela preposta da Ré em audiência (ID. 341b3c8 - Pág. 1), fábrica esta que até hoje permanece ativa.
Em 1991, com a edição e vigência do Anexo 12 da NR 15 do Ministério do Trabalho, o Brasil limitou a utilização do asbesto. Em tal anexo, consta a proibição da utilização de qualquer tipo de asbesto do grupo anfibólio e dos produtos com tais fibras, bem como da pulverização (spray) de todas as formas de asbesto. Além disso, tal norma definiu ainda a limitação de tolerância para fibras respiráveis de asbesto crisotila de 2,0 f/cm³.
A Lei 9.055/95, por sua vez, manteve as mesmas vedações do Anexo 12 da NR 15 e trouxe algumas outras no seu art. 1º, limitando a variedade crisotila para extração, utilização, industrialização e comercialização na forma de seus dispositivos, tendo mantido, ainda, a possibilidade de uso, exploração e comercialização (etc) quanto à variedade crisotila (art. 2º), e no seu art. 3º estabelecido que "as atuais normas relativas ao asbesto/amianto da variedade crisotila e às fibras naturais e artificiais referidas no artigo anterior, contidas na legislação de segurança, higiene e medicina do trabalho, nos acordos internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil e nos acordos assinados entre os sindicatos de trabalhadores e os seus empregadores, atualizadas sempre que necessário".
Os §§2º e 3º do mencionado art. 3º da Lei 9.055/95 ainda estabeleceu que a fiscalização seria feita pelo Poder Executivo e também pelas comissões de fábrica, além de ter estabelecido prazo para que fosse firmado o acordo entre os sindicatos dos trabalhadores e seus empregadores, sob pena de automático cancelamento do alvará de funcionamento das empresas que assim não fizessem.
Com base nisso, as entidades representativas das categorias dos empregados e empregadores estabelecem o Acordo Nacional para Extração, Beneficiamento e Utilização Segura e Responsável do Amianto Crisotila (vide, p.ex., doc. 07 - Acordo 2013/2015, p.ex.), o qual é anualmente renovado, como é fato incontroverso.
Em 2001, o Estado do Rio de Janeiro editou a Lei 3.579/01, que estabeleceu a proibição de extração do asbesto em todo o Estado, bem como estabeleceu um cronograma de prazo de 2 a 4 anos a ser observado em relação à proibição feita quanto à fabricação e comercialização de vários produtos, inclusive de produtos derivados do amianto.
A Convenção 162 da OIT de 1986, cuja vigência interna ocorreu em maio de 1991, por sua vez, trata do asbesto e em seu artigo 10 estabelece que: "Quando for necessário para proteger a saúde dos trabalhadores e seja tecnicamente possível, a legislação nacional deverá estabelecer uma ou várias das medidas seguintes: a) sempre que for possível a substituição do asbesto, ou de certos tipos de asbesto ou de certos produtos que contenham asbesto, por outros materiais ou produtos ou a utilização de tecnologias alternativas, cientificamente reconhecidas pela autoridade competente como inofensivos ou menos nocivos; b) a proibição total ou parcial da utilização do asbesto ou de certos tipos de asbesto ou de certos produtos que contenham asbesto em determinados processos de trabalho".
O meio ambiente de trabalho hígido e saudável é direito fundamental difuso, com previsão constitucional nos artigos 200, VIII, e 225, caput, da CR/88, sendo, por óbvio, dever do empregador zelar pela sua higidez e salubridade, por ser ele o detentor dos meios de produção, ainda mais tendo-se em conta que uma das suas obrigações é reduzir os riscos a que estão sujeitos os trabalhadores, conforme, aliás, determina a Constituição da República (art. 7º, XXII).
Aliás, o art. 225 da CR é a mais pura tradução do princípio da prevenção que determina a obrigação de todos de proteger e preservar o meio ambiente, inclusive o do trabalho, encontrando amparo, ainda, no princípio 6 da Declaração Universal de Estocolmo de 1972 sobre o meio ambiente, que atinge a toda a coletividade.
A mais que isso, a dignidade da pessoa humana é princípio norteador de toda a Constituição da República, devendo os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa da mesma forma observarem esse valor central, de forma a construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem como a promover o bem de todos indistintamente e garantir o desenvolvimento nacional (arts. 1º e 3º), com ênfase no âmbito internacional para a prevalência dos direitos humanos (art. 4º).
Não é por outro motivo, aliás, que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e tem na defesa do meio ambiente um de seus princípios mais basilares, sendo a todos assegurado o livre exercício de qualquer atividade econômica, à exceção dos casos previstos em lei (art. 170 da CR/88).
A ordem social da mesma forma funda-se no primado do trabalho, com objetivo de assegurar o bem estar e a justiça sociais, tendo a Constituição expressamente estatuído que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas públicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos (arts. 193 e 196).
Em relação à Convenção 162/OIT, não há dúvidas de que, na forma já reconhecida pelo STF, por se tratar de norma consagradora de direitos humanos que ingressou no nosso ordenamento anteriormente à EC 45/04, seu status é de norma supralegal (art. 4º, II, da CR/88), ou seja, ela prevalece sobre a Lei 9.055/95, tendo em vista o controle de convencionalidade das normas internas, de modo a paralisar a eficácia desta última norma federal, ao menos em relação ao permissivo contido no art. 2º de tal Lei 9.055/95.
Outrossim, percebe-se que a norma estadual 3.579/01-RJ melhor se coaduna com os princípios assegurados constitucionalmente e já citados acima, alinhando-se também com os ditames da Convenção 162/OIT, ou seja, tal norma estadual atinge o primado hermenêutico da máxima efetividade da Constituição, até porque o risco causado pelo amianto à saúde dos trabalhadores da fábrica de Guadalupe é claro, conforme já se discorreu nas linhas pretéritas.
E nem se cogite em inconstitucionalidade da referida Lei Estadual, por suposta invasão de competência legislativa da União, pois é competência comum da União, Estados e Municípios cuidar da saúde e proteger o meio ambiente. Nesse sentido, inclusive, é a recente decisão do Òrgão Especial do TJ/RJ na apreciação da Arguição de Incidente de Inconstitucionalidade 0350430-60.2009.8.19.0001, cuja relatora foi a Desembargadora Gizelda Leitão Teixeira, que posteriormente à apreciação de tal tese determinou o retorno do recurso principal para apreciação da 20ª Câmara Cível daquela Eg. Corte, o que só confirma a plena eficácia de tal norma estadual.
Por oportuno, rememore-se que a ação civil pública pode sim apreciar incidentalmente a inconstitucionalidade (e obviamente reconhecer a constitucionalidade também) de normas, como já sedimentado na doutrina e jurisprudência, sem que isso signifique usurpar a competência do STF, pois é prerrogativa de todo magistrado a declaração difusa de inconstitucionalidade de norma, cabendo ao STF a declaração concentrada e que não é apreciada nas ações civis públicas, menos ainda na presente.
A presente decisão obviamente em nada afeta os julgamentos das inúmeras Ações Diretas de Inconstitucionalidade pendentes de apreciação no STF sobre o mesmo tema, inclusive as que questionam as Leis Federal 9.055/95 e Estadual 3.579/01-RJ(vide dentre tantas as ADIs 3406, 3470 e 4066), pois a presente ação civil pública tem objeto específico e diverso delas. Em outros termos, a presente ação em nenhum momento pretende a declaração concentrada de constitucionalidade ou inconstitucionalidade qualquer norma, ocasião em que aí sim a competência seria da Suprema Corte.
Dito isso, percebe-se que o prazo fixado pela Lei Estadual 3579/01 já venceu há muito tempo, mas até hoje a Ré permanece com as atividades da Fábrica de Guadalupe com a utilização do amianto,tendo em vista a decisão do TJ/RJ no MS 0013778-67.2002.8.19.0000, a qual, porém, não atinge os efeitos da presente ação civil pública, até por conta das autoridades coatoras constantes do Mandado de Segurança da Justiça Comum.
Ultrapassada essa questão, em depoimento pessoal, o preposto do réu confirmou que "desde 1949 há operação na planta de Guadalupe, com a utilização de amianto; que há cerca de um ano ou dois a fábrica do Rio já iniciou os testes para substituição do amianto, mas de forma ainda muito incipiente no Rio, pois essa substituição está em fases mais avançadas em Colombo-PR e em Goiania; que a fábrica do Rio comercializa o produto fibrocimento com recursos sintéticos(CRFS - cimento reforçado com fio sintético), mas não pode dizer se esse tipo de produto é originário dos testes realizados no Rio ou daquele das outras unidades; que há uma fábrica em Manaus para produção do próprio fio sintético de polipropileno, mas em início de atividades, em fase de testes, pois ainda assim é necessária a utilização do PVA - polivinil álcool, que é um produto importado; que o fio produzido em Manaus encontra- se incorporado em sua produção, mas ainda de forma reduzida pelo início da atividade ter ocorrido há pouco tempo".
Extrai-se desse depoimento, que a Ré já possui a tecnologia adequada para a substituição do amianto, embora em fase inicial e incipiente. Contudo, o prazo postulado na inicial é ínfimo e impossibiltaria a própria continuidade produtiva da Ré, gerando diversos prejuízos inclusive para os seus atuais empregados, clientes e fornecedores, máxime diante da crise econômica que ainda assola o país.
Diante de todo o exposto, acolho parcialmente o pedido e fixo o prazo de 18 meses - totalmente razoável, haja vista as declarações do preposto já citada - a contar da data da sua ciência da presente decisão (tendo em vista os riscos a que são expostos os trabalhadores mesmo que observado o limite de 0,1f/cm³ e a normatização nacional, estadual e internacional extensamente citada, preenchendo assim os requisitos para tal cumprimento independentemente do trânsito em julgado), para que a Ré proceda à substituição da matéria-prima amianto, qualquer que seja a sua variedade, por matérias-primas alternativas sem amianto na fabricação de artefatos de fibrocimento, sob pena de multa cominatória de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por dia de atraso, pois o valor superior de astreintes postulado pelo MPT, no particular, é excessivo para tanto.
Elucide-se, desde já, que a decisão deste Eg. Regional no MS nº 0010203-47.2015.5.01.0000 em nada obsta ou atinge a presente decisão, pois apenas ataca especificamente a decisão de tutela de urgência que havia concedido a liminar postulada pelo MPT, anteriormente à própria instrução, mas agora a sentença é de mérito e definitiva e impôs prazo razoável tendo em vista inclusive as declarações do preposto da Ré.
OBSERVÂNCIA DO LIMITE 0,1 f/cm³ - PARALISAÇÃO DAS ATIVIDADES DOS SETORES EM CASO DE DESRESPEITO A TAL LIMITE
Tendo em vista tudo que foi fundamentado acimainclusive a situação citada pela testemunha Elitom de que houve um caso há poucos anos em que o limite supra foi desrespeitadobem como a fim de se garantir a saúde e segurança dos trabalhadores e porque a Constituição assegura no art. 7º, XXVI, a prevalência das normas coletivas, que também se aplica à hipótese em relação ao Acordo Nacional, julgo procedente o pedido para determinar que, desde a ciência dessa decisão e até a implementação da obrigação supra (tendo em vista que tal obrigação foi firmada pelas partes autonomamente e o direito à saúde e segurança é norma fundamental e, por isso, exige pronto respeito, tem-se por preenchidos os requisitos para tal cumprimento independentemente do trânsito em julgado), a Ré deve observar o limite máximo estabelecido no Acordo Nacional combinado com o art. 3º da Lei 9.055/95, isto é, de 0,1 f/cm³ de amianto em todos os locais de trabalho, sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a cada constatação de irregularidade, sem prejuízo das demais cominações impostas no Acordo Nacional e na própria Lei 9.055/95, pois, no particular, o comando judicial é de tutela inibitória.
Reitero que a decisão deste Eg. Regional no MS nº 0010203-47.2015.5.01.0000 em nada obsta ou atinge a presente decisão, pois apenas ataca especificamente a decisão de tutela de urgência que havia concedido a liminar postulada pelo MPT, anteriormente à própria instrução, mas agora a sentença é de mérito e definitiva.
Assim, fica alterada parcialmente, nestes termos, com efeito ex nunc, a tutela de urgência anteriormente vigente.
Por outro lado, é a cláusula 69, §1º, do referido Acordo Nacional que estabelece um prazo máximo de 30 dias para lidar com os problemas daí advindos, em caso de constatação de excesso a tal limite, prazo máximo que sempre foi devidamente observado pela Ré, como é fato incontroverso nos autos, além de confirmado pela própria documentação carreada à inicial e também ter sido objeto de menção pela testemunha ouvida Elitom.
Nesse sentir, percebe-se que a cláusula 55 não pode ter sua interpretação ampliada na forma postulada na inicial para significar a imediata paralisação das atividades do setor produtivo em que se constatar excesso ao limite de 0,1 f/cm³.
Em realidade, o acordo nacional já prevê a forma como cada trabalhador deve proceder individualmente na cláusula 55, mas isso não abrange, ex lege, a coletividade do setor, tal como veiculado na inicial, não possuindo tal cláusula a extensão pretendida pelo MPT, já que não determina a paralisação das atividades do setor produtivo, mas sim o direito de resistência de cada trabalhador individualmente que se encontrar em uma situação de eminente risco para sua saúde e segurança, situações inconfundíveis. Nada impede que todos os trabalhadores utilizem-se do direito de resistência ali previsto, porém não há como se alterar os termos do Acordo Nacional pela via judicial.
Com efeito, o que o MPT pretende, no particular, é a modificação do Acordo Nacional, pela via judicial, o que, além de violar a autonomia coletiva assegurada e privilegiada pela CR/88, no seu art. 7
º, XXVI e no art. 3º da Lei 9.055/95, transformaria o Poder Judiciário em legislador positivo, função inerente ao Parlamento e, no caso específico, aos próprios atores coletivos.
Assim, pelas razões supra, julgo improcedente o pleito definitivo de item 6.2 e, consequentemente, a liminar de item 5.2, ficando, consequentemente, cassada, com efeito ex tunc, a liminar anteriormente concedida nesse particular.
AMPLIAÇÃO DO ROL DE EXAMES MÉDICOS
Haja vista toda a fundamentação exposta supra, especialmente de que as doenças causadas pelo Amianto as vezes demoram cerca de 30 anos para o surgimento dos primeiros sintomas, bem assim porque os estudos científicos citados supra evidenciam a relação do amianto para o surgimento também de tais doenças, e também pela urgência da medida, considerando-se os mesmos fundamentos supra, para concessão da tutela de urgência anteriormente deferida, acolho o pedido do MPT para determinar, a contar da ciência da presente decisão, a ampliação do rol de exames médicos de controle de todos os atuais e ex- empregados da fábrica no Rio de Janeiro para a inclusão dos exames de diagnóstico de neoplasia maligna do estômago (C16), neoplasia maligna da laringe (C32), mesotelioma de peritônio (C45.1) e mesotelioma de pericárdio (C45.2), sob pena de multa cominatória de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por descumprimento em relação a cada trabalhador.
Elucide-se que essa determinação decorre de todos estudos científicos sobre o tema, inclusive já citados no tópico relativo à substituição do amianto que relacionam essas doenças à exposição ao amianto e também porque o direito à saúde é norma de direito fundamental, assegurada constitucionalmente, bem como porque o direito ambiental do trabalho tem nos princípios da prevenção, da responsabilidade e do poluidor pagador seus grandes vetores, pelo que não há nenhuma suposta violação ao disposto nas NRs 7 e 15, a par da manifestação defensiva em sentido oposto.

DIVULGAÇÃO DE CONVOCAÇÃO PARA EXAMES MÉDICOS EM JORNAIS E TV
O presente processo e a presente decisão já são públicos, cabendo às associações e sindicatos interessados fazer a sua divulgação, se assim entenderem conveniente e da forma como melhor entenderem, responsabilizando-se por seus atos, obviamente, em caso de excessos e abusos.
Não é o caso, porém, de convocação para exames médicos em jornais e TV, a custo da Ré, pois isso implicaria exposição excessiva da sua imagem perante a sociedade como um todo, além de também significar, ainda que indiretamente, a exposição da imagem e intimidade também dos seus antigos e atuais empregados, sem que necessariamente eles com isso concordem.
Aliás, a preservação da imagem da Ré, no aspecto, é garantia inclusive de preservação dos empregos que ela assegura e da própria continuação da sua atividade produtiva, bem como do cumprimento de todas as obrigações decorrentes dessa sentença, inclusive da substituição do uso do amianto.
Não é demais lembrar que o art. 5º da CR/88 assegura a todos, inclusive às pessoas jurídicas, o direito à imagem e os arts. 1º, IV, e 170 da CR/88 colocam o valor social do trabalho e da livre iniciativa em igual patamar.
Julgo, assim, improcedentes todos os pedidos nesse sentido, tanto os liminares quanto os definitivos.

DESPESAS DE DESLOCAMENTO E HOSPEDAGEM
Na forma do art. 927 do CC, todo aquele que, por ato ilícito, causa dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. O parágrafo único do referido artigo ainda elucida que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, inclusive nos casos em que a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Com efeito, tendo em vista todos os efeitos maléficos que o amianto causa à saúde daqueles que ficam expostos a ele, como já amplamente fundamentado em tópico precedente, não há dúvidas de que a teoria da responsabilidade objetiva se enquadra com perfeição à hipótese, já que aqueles ex-empregados e empregados atuais da Ré que atuam com exposição ao amianto ficam expostos a riscos que os demais membros da sociedade, em regra, não possuem.
Decorre daí a obrigação direta da Ré ora impostade custear as despesas de deslocamento e as despesas de hospedagem para todos os ex-empregados da fábrica no Rio de Janeiro, que comprovadamente residirem em domicílio distante a mais de 100 km do local dos serviços médicos de realização periódica de exames médicos de controle de agravos à saúde passíveis de associação à exposição ocupacional ao amianto, sob pena de multa cominatória de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por cada descumprimento em relação a cada ex-empregado, ratificando-se, pois, a decisão de tutela de urgência anteriormente deferida.
Nesse sentir, a presente obrigação também deve ter seu cumprimento imediato após a ciência da Ré da sentença, tendo em vista a urgência na proteção à saúde já tão mencionada nessa sentença e a garantia constitucional que lhe é assegurada pela CR/88 (vide, dentre tantos já citados acima, os arts. 196 e 200, VIII).
Registre-se, ainda, que a presente obrigação decorre do citado artigo civilista, não havendo, pois, nenhuma violação às NR's citadas pela defesa, obviamente.
ENVIO DE DOCUMENTOS MÉDICOS E FUNCIONAIS DOS EMPREGADOS E EX-EMPREGADOS AO SUS, À FIOCRUZ E AO SINDICATO
Os pedidos do MPT, no particular, esbarram novamente no direito constitucionalmente assegurado à inviolabilidade da intimidade e privacidade de que gozam aqueles ex e atuais empregados da Ré.
Com efeito, a divulgação e envio de documentos médicos e funcionais, mesmo que para órgãos oficiais, entidades que estudam a saúde do trabalhador, bem como para os entes profissionais representativos da categoria, significaria inegável afronta aos princípios constitucionais citados acima.
A inconstitucionalidade das normas que assim prevejam é patente e notória, aliás, independentemente de a finalidade buscada ser sim de preservar a saúde da coletividade e prevenir que novas doenças sejam causadas.
Além disso, a inexequibilidade dessa obrigação evidencia o quão desarrazoada seria a determinação de seu cumprimento, com entrega de documentos de mais de 20 anos de seus ex e atuais empregados.
Diante do exposto, julgo improcedentes os referidos pedidos, inclusive os pleitos liminares, cuja decisão que havia concedido a tutela de urgência, aliás, já havia sido cassada por decisão do C. STJ.
DANO MORAL COLETIVO
Inicialmente, tem-se que a análise do alegado dano moral coletivo deve ser feita na integralidade quanto aos fatos narrados na inicial, inclusive em relação aos pedidos objeto de acordo parcial, pois o acordo apenas disse respeito às respectivas obrigações de fazer ali dispostas e apenas foram extintos, com resolução do mérito, os pedidos respectivos, mas isso em nada abrangeu o pedido de indenização/compensação pelo ventilado dano moral coletivo.
A caracterização do dano moral coletivo está intimamente ligada à ofensa diuturna e ao desapreço, em si, a direitos difusos e coletivos, cuja essência é tipicamente extrapatrimonial, não havendo, assim, nenhuma necessidade de comprovação de perturbação psíquica da coletividade ou mesmo das partes envolvidas.
Uma vez constatada a ofensa, o dano se presume do próprio ato ilícito (dano in re ipsa).
O que deve ser analisada é a gravidade da violação cometida frente à ordem jurídica, sendo totalmente desnecessária a demonstração da repercussão de eventual violação na consciência coletiva do grupo social, uma vez que a lesão moral sofrida por este grupo decorre, exatamente, da injusta lesão a direitos metaindividuais socialmente relevantes.
Pois bem.
Ainda que a Ré insista em dizer que é pessoa jurídica distinta e absolutamente alheia à empresa italiana de mesmo nome (ETERNIT) e ao próprio grupo suíço, fato é que a presunção que se tem é outra, não somente porque o nome de todas é ETERNIT, mas também porque inegavelmente, para fins trabalhistas, elas fazem parte sim de um mesmo grupo econômico (art. 2º, §2º, da CLT).
Entretanto, independentemente de ser ou não filial ou braço da Eternit italiana ou suíça, fato é que a Ré iniciou a exploração das suas atividades com Amianto na fábrica de Guadalupe nesta Capital ainda no final da década de 1940 (como é incontroverso e foi afirmado pelo próprio preposto em audiência), quando já havia inúmeros estudos publicados sobre os danos relacionados à exposição ao amianto, como já se fundamentou em tópico precedente.
Nesse sentir, embora o Brasil tenha admitido a permanência de exploração do amianto produzido pela Ré, fato é que, como já dito, aplica-se ao caso, ainda assim, a teoria do risco, na forma do parágrafo único do art. 927 do CC.
Ora, a Ré sempre expôs seus trabalhadores a inegável risco bem superior àqueles demais integrantes da sociedade civil.
Aliás, o princípio ambiental da responsabilidade prevê da mesma forma que os danos causados ao meio ambiente, inclusive do trabalho, deve ser restaurados, independentemente de culpa, sendo mera consequência desses danos ambientais os danos pessoais causados aos seus atuais e antigos empregados, ou seja, à coletividade. Exegese dos arts. 225, §3º, da CR/88 c/c 200, VIII, da CR/88 e arts. 4º, VIII, e 14, §1º, da Lei 6938/81.
O documento 24 (anexo 10 - pgs. 1925/1946) consistente na oitiva de vários ex-empregados da Ré no Inquérito Civil, que ali foram devidamente advertidos sob as penas da lei, deixa ainda mais evidenciada a responsabilidade da Ré, no particular. Rememore-se, no aspecto, que a natureza dessa prova é documental.
O depoente Sr. Agostinho Gomes que trabalhou na Ré de 1964 a 1979 evidencia que a Ré àquela época, embora já tivesse ciência dos danos causados pela exposição dos seus trabalhadores ao asbesto, por todos os estudos que já haviam sido publicados na época e conforme já se elucidou e fundamentou de forma extensa em tópico precedente, sequer informava aos seus empregados da época os riscos à saúde oriundos dessa exposiçãomenos ainda fornecia máscaras, tanto que o Sr. Agostinho foi constatado como portador de asbestose (pg. 1925 - anexo 10).
O Sr. Luiz Carlos laborou entre 1983 e 1984 e tampouco tinha ciência ou informação da empresa sobre os riscos advindos dessa exposição (pg. 1926 - anexo 10).
Já o Sr. Celso Antônio, que laborou entre 1964 e 1996, salientou que tampouco tinha ciência ou informação da Ré sobre os riscos do amiantoque somente em meados de 1980 passou a receber tais informações, palestras, EPIs, bem como que o uniforme era lavado em sua residência até tal época e só depois passou a ser lavado na empresa, tendo deixado claro que havia muita poeira no processo produtivo, motivo porque inclusive foi diagnosticado com placas pluerais (pg. 1927 - anexo 10).
Por sua vez, o Sr. José dos Santos Junior, que laborou entre 1964 e 1989 confirmou que no início lavava o uniforme em casa e somente no final do seu contrato ele passou a ser lavado na empresa, que havia poeira no setor da área produtiva e que o depoente foi diagnosticado com placas pleurais e cicatriz no pulmão, embora estagnados (pg. 1928 - anexo 10).
O Sr. Hermínio laborou na Ré entre 1967 e 1984 e tampouco foi informado sobre os riscos do amianto, tendo que lavar em casa o seu uniforme e levando consigo resíduos da fábrica para fazer calçamento e piso, tendo elucidado, ainda, que o resíduo do processo produtivo era levado por um caminhão, mas despejado em terreno baldio próximo à estação de trem, bem como que havia muita poeira na fábrica, tendo sido diagnosticado com placas pleurais por exposição ao amianto (pg. 1929/1930 - anexo 10).
A seu turno, o Sr. Almir Cortes da Silva, que laborou na Ré de 1974 a 1983, disse que a empresa nunca informou sobre os riscos do amianto, que não era fornecida máscara, bem como que seus uniformes, quando passaram a ser fornecidos, eram lavados em sua casa, confirmando que havia muita poeira na fábrica e que não havia sistema de exaustão na época e que cada trabalhador era responsável pela varrição da sua área de trabalho, tendo sido diagnosticado com asbestose pela FIOCRUZ (pg. 1931 - anexo 10).
Por fim, o Sr. Geraldo Mariano, que laborou na Ré de 1962 a 1968, reforçou que a ré não informava sobre os riscos de exposição ao amianto, bem como que trabalhava de chinelo por boa parte do contrato e depois comprou um tênis "kichute" para trabalhar, que lavava os uniformes em sua casa e que havia muita poeira, a qual era varrida somente com vassoura, e que a empresa levava os resíduos da produção da fábrica através de caminhão e jogava nos arredores da própria fábrica, salientando, ainda, que seus exames acusaram a presença de placas pleurais e asbestose (pg. 1932/1946 - anexo 10).
Quase todos os referidos depoentes ainda disseram que recebem plano de saúde e receberam indenização em dinheiro da Ré em valores variados, de acordo com transação extrajudicial feita com ela, e, à exceção do Sr. Almir, nenhum dos empregados ajuizou ação judicial a respeito.
As testemunhas Eduardo e Elitom ouvidas neste processo não afastam as conclusões de que a Répor décadas deixou de informar seus empregados sobre os riscos decorrentes da exposição do amianto, embora destes tivesse plena ciência, especialmente pela sua correlação com as empresas estrangeiras de mesmo nome e pelos diversos países banindo o uso de tal mineral e pelas infinidades de estudos e normas internacionais sobre o tema, tendo sido omissa ainda por longos anos no fornecimento de máscaras até meados de 1980, bem como de que a fábrica nessa época e por décadas continha muita poeira, que era descartada de forma incorreta, bem como que eram os próprios empregados sem proteção adequada que faziam a varrição, as vezes inclusive levando materiais de amianto para casa, além de lavarem o uniforme por longos anos em sua residência, sem qualquer atitude impeditiva da Ré em relação ao fato desses empregados levarem tais materiais danosos para casa e sem qualquer atitude empresarial de reduzir os riscos com a lavação do uniforme na própria empresa.
Isso porque tais testemunhas Eduardo e Elitom laboraram em épocas distintas na fábrica do Rio em relação aos depoentes do Inquérito Civil, isto é, de 1992 a 2008 e de 2008 até os dias atuais.
Na verdade, ainda que as testemunhas Eduardo e Elitom tenham elucidado a melhora na prestação das informações aos seus empregados, bem como confirmado a existência de treinamentos e cursos sobre os riscos do Amianto e que os EPIs e EPCs são fornecidos e o uso é fiscalizado, fato é que a própria testemunha Sr. Elitom ainda elucidou que "nem todos os empregados utilizam atualmente os respiradores, pois os índices atuais de medição da empresa respeitam os acordos coletivos e estão em 0,10 f/cm³, diante do que só alguns no setor de matéria prima utilizam de forma preventiva; que desde de que o depoente encontra-se na ré, ou seja, por volta de 2006, os índices estão em 0,10 f/cm³, sendo que nos arquivos anteriores da empresa também há menção desse mesmo índice; que houve uma medição há cerca de dois anos cujo índice foi de 0,13f/cm³, não se recordando de mais nenhuma diferente dessas já mencionadas; que existe um prazo de trinta dias para que sejam tomadas medidas corretivas em casos em que o limite do índice é ultrapassado, mas no caso que mencionou acima não sabe dizer quais foram as medidas corretivas tomadas; (...) que existe uma instrução interna na ré que permite ao empregado se recusar a trabalhar caso entenda que está em risco por conta do amianto, mas não se recorda de nenhum empregado que tenha feito uso desta instrução; (...) que o depoente tem conhecimentos das orientações da OMS, através de cursos, mas nunca estudou a fundo tais orientações e normas; que não se recorda de nenhuma orientação específica da OMS acerca do uso seguro do amianto no presente momento".
De tal depoimento, extrai-se que a testemunha Elitom, que é o atual engenheiro que exerce a gestão de segurança no trabalho e prevenção de acidentes de trabalho da fábrica no Rio,desconhece as normas da OMS acerca do uso seguro do amiantoo que só confirma, em realidade, que mesmo a Ré tentando melhorar as informações passadas aos seus empregados, ainda assim são insuficientes sobre todos os riscos e cuidados necessários no labor com exposição ao amiantotanto que se conclui que na verdade nenhum empregado jamais fez uso do direito de resistência quanto à não laborar em ambiente inseguro (cláusula 55 do Acordo Nacional).
A mais que isso, a referida testemunha ainda elucidou que a Ré ultrapassou os limites fixados no Acordo Nacional, ao que tem conhecimento, pelo menos uma vez, de modo que, independentemente de ter solucionado no prazo previsto o referido problema, fato é que violou a cláusula 73 do Acordo Nacional, trazendo a aplicação direta especialmente do princípio ambiental da responsabilidade no particular.
Além disso, os depoimentos de tais testemunhas ouvidas em juízo tampouco afastam as conclusões de que vários ex-empregados da Ré foram vítimas de asbestose e outros possuem placas pleurais, tudo decorrente da excessiva exposição deles ao amianto, a ensejar, novamente, a aplicação da teoria do risco, como já descrito supra.
Não é só.
Os documentos 31 e 32 (anexos 11 e 12, referentes respectivamente aos Srs. Elvio Gomes Caramuru e Alfredo José Mion) confirmam a morte de ex-trabalhadores da Ré na fábrica desta Capital por asbestose/neoplasia pulmonar ou por mesotelioma peritoneal, ou seja, com pronta relação direta com o labor em exposição ao amianto.
O documento 33 ainda confirma que o Sr. Jorge Pereira, também ex-empregado da Fábrica de Guadalupe da Ré, foi diagnosticado com asbestose e placas e calcificações pleurais.
Esses casos apenas servem de exemplo do quanto eram expostos seus trabalhadores ao amianto, o qual gerou devastadoras consequências na vida de seus ex-empregados e ainda gera na de seus atuais empregados, por mais que atualmente a Ré tenha alterado condutas que antes expunham seus trabalhadores a risco ainda mais elevado (embora, como já amplamente fundamentado, o risco atual permaneça, mesmo que de forma reduzida).
Não bastasse tudo o que já foi dito, a decisão de tutela de urgência liminar, no mais, fez umaanálise precisa da prova documental juntada com a inicial, documentação esta que, reitere-se, não foi objeto de impugnação específica, o que confirma a veracidade dos fatos ali indicados.
Nesse sentir, transcrevo o trecho da decisão (ID aeb6777) que já fez uma precisa análise dessa documentação, confirmando assim os danos causados, mesmo nos anos de 2008 a 2012, a par do que disseram as testemunhas, confirmando, pois, a violação ao ordenamento jurídico e os próprios danos daí advindos (in re ipsa), in verbis:

"Da análise dos doze volumes de documentos que totalizam 2.359 folhas, comprovou-se nos relatórios de comissão de fábrica realizados pela própria reclamada entre os anos de 2008/2012,diversas irregularidades encontradas na fábrica do réu, conforme exposto pelo autor na peça exordial, em parte negociadas pelos litigantes:

Problema encontrados em 2008:
1. Agitador de massa com vazamento no eixo. 30/01/2008
2. TAC encontra-se com vazamento no eixo agitador. 28/02/2008
3. Agitador de massa fresca vazando dos dois lados. 28/02/2008
4. Eixo do agitador de amianto vazando. 28/02/2008
5. Vazamento no eixo do agitador do TAC (H22) 27/03/2008
6. Vazamento no eixo do agitador de massa fresca (H22) 27/03/2008
7. Vazamento no eixo do agitador de massa fresca (H23) 27/03/2008
8. Vazamento no eixo do agitador de amianto (H23) 27/03/2008
9. Fosso do moinho de filler está com material no chão. 28/06/2008
10. Problema na vedação do TAC da H22. 19/08/2008
11. Problema na vedação da H23. 19/08/2008
12. Problema na vedação da H23. 25/10/2008
13. Problema na vedação do eixo do agitador de amianto da H22 25/10/2008
14. Problema na vedação do eixo do agitador de amianto da H23. 25/11/2008
15. Fosso do moinho de filler está com material no chão. 25/11/2008
16. Cacos na parte de baixo da esteira do filler. 22/12/2008
17. Problema de vedação na esteira retalhadeira 22/12/2008
Fls. 221/280 (anexo 2). 

Problema encontrados em 2009:
1. Trocar tubulação que está furada no filler. 28/01/2009
2. Fazer vedação no britador e no filler. 28/01/2009
3. Tubulação furada no moinho de filler. 25/02/2009
4. Vedação da esteira retalhadeira. 25/02/2009
5. Tubulação furada (filler). 27/03/2009
6. Vedação da esteira da retalheira ruim. 27/03/2009
7. Tampa de acrílico do moinho de filler furada. 28/04/2009
8. Gaxeta da bomba de envio de amianto com problema na via úmida 28/04/2009
9. Fosso com pó no chão 27/07/2009 
Fls. 281/341 (anexo 2) 

Problema encontrados em 2010:
1. Sistema de desempoeiramento da H22 com Problema 22/01/2010
2. Tubulação com vários furos (moinho filler) 22/01/2010
3. Melhorar vedação do britador (moinho filler) 22/02/2010
4. Melhorar vedação do britador (moinho filler) 27/04/2010 Fls. 342/437 (anexos 2/3)

Problema encontrados em 2011:
1. Troca de vedação da bomba de envio de amianto do agitador. 25/04/2011
2. Troca da vedação do moinho secundário. 25/04/2011
3. Vedação na bomba de envio de amianto. 24/08/2011
4. Soldado furo na tubulação do filler. 30/06/2011
5. Vedação no desempoeiramento do agitador do britador 30/06/2011
6. Vedação do eixo agitador de resíduo ruim 28/07/2011
7. H-22 vedação do eixo agitador de amianto ruim 28/07/2011
8. Troca de mangueira de ar comprimido da válvula de passagem de amianto 24/08/2011
9. Vedação da bomba de envio de amianto 24/08/2011
10. Recorte de materiais com aproveitamento - solda no furo da tubulação de aspiração 25/11/2011
Fls. 438/467. (anexo 3)

Problema encontrados em 2012:
4. Solda no furo da tubulação de passagem de amianto. 31/01/2012
5. Solda no furo da tubulação de recirculação de amianto. 30/03/2012
6. Melhora na vedação da estrutura dos martelos. 25/05/2012
7. Revisar bomba de vácuo soldar furo. 02/11/2012
Fls. 468/521 (anexo 3) 

Já os documentos que se encontram nos anexos 4, 5, 6 e 7, laudos de avaliação ambiental de fibra de amianto nos postos de trabalho dos anos de 2002 a 2004, confirmam que apesar da avaliação quantitativa do amianto estar de acordo com os limites de tolerância previstos na Norma Regulamentadora n° 15, anexo n° 12 e no Acordo Nacional de Uso Seguro do Amianto, cláusula n°73, a exceção dos laudos realizados em dezembro de 2002 (fl. 691 do anexo 4), abril de 2003 (fl. 723 do anexo 4, sendo que ao contrário do relatório apresentado pelo MPT, as concentrações de amianto apresentadas foram de 0,19 f/cm3 e 0,13 f/cm3) e junho de 2004 (fls. 701 e 702 do anexo 4), em que foram encontrados operários expostos acima do limite previsto, a avaliação qualitativa demonstrou contaminação ambiental pelo amianto.
Ainda analisando os laudos de avaliação ambiental de fibra de amianto após 2004, ou seja, a partir de 2010 até 2012 não foram encontradas irregularidades quantitativas, mas qualitativamente o ambiente de trabalho continuou a registrar diversas irregularidades como existência de material já seco, agregado a esteira do retalhadeiro na máquina H-23, material já muito fragmentado armazenado descoberto no pátio; na máquina H-22 e H-23 0a existência de material particulado depositado, Fls. 731, 765, 766, 798 do anexo 4, fl. 1058 do anexo 6, material armazenado descoberto no pátio da empresa, fl. 797 do anexo 4, documentos de fls. 920, 921, 932 do anexo 6.
Continuando nas irregularidades apontadas pelo laudo de avaliação no ano de 2013, os documentos de fls. 946 do anexo 07 indicam "pequena quantidade de cacos secos depositados nas laterais" da esteira transportadora de material do pré-cobrador para o moinho.
Os documentos mencionados acima demonstram que os resultados quantitativos do amianto não se encontram em consonância com a análise qualitativa do ambiente de trabalho, através das análises feitas tanto pela comissão de fábrica quanto pelos laudos de avaliação ambiental entre os anos de 2002 e 2013.
Mais recentemente, ou seja, a partir do segundo semestre de 2013 até agosto de 2014, através de vistorias feitas pelo autor, utilizando engenheiros e médicos de segurança do trabalho, o Juízo constata que a situação já narrada nos anos anteriores somente piorou, senão vejamos:
- Em 29/09/2011, constato a falta de limpeza das superfícies da máquina, o que permite deposição de grande quantidade de crostas e poeiras com amianto. Fl.1239 do anexo 7, cujas fotos 7 e 8 de fl. 1243-verso corroboram a irregularidade narrada.
- Em 18/12/2013, verifico na ausência de grade inferior da esteira e máquina H-23F existência de material particulado depositado, existência de poeira depositada em guardas corpos, máquinas, extintores e grelhas. Fl. 214-verso e fl. 215 do anexo 2.
- As atas de reunião da CIPA também indicaram registro de poeira excessiva no pátio de estacionamento, assim como, na última vistoria realizada pelo autor em 12/08/2014 conforme documento de fls. 1.247, fotos 1 a 4, anexo 7, "onde se constata visualmente que os pneus das empilhadeiras imprimem suas marcas em relevo na poeira e no material particulado existente no chão.
- Constato também através da mesma vistoria realizada pelo autor em 12/08/2014 a existência de sacarias de amianto danificadas e a presença de poeira depositada nas instalações industriais, conforme documentos de fl. 1247-verso, foto 5 a 8, anexo 7.
- Verifico nos documentos de fls. 1.250-verso/1.251-verso do anexo 07 que a ré não cumpre com a previsão de existência de vestiário duplo conforme determina o item 15.1 do anexo 12 da NR 15. (instalação que oferece uma área para guarda de roupa pessoal e outra, isolada, para guarda de vestimenta de trabalho, ambas com comunicação direta com a bateria de chuveiros) foto 23.
Em relação à quantidade de chuveiros a foto 24 do mesmo documento demonstra que dos nove pontos de saída de agua apenas três tem chuveiros em condições adequadas de uso, em violação ao item 24.1.12 da NR 24 que determina a existência de um chuveiro para cada grupo de dez trabalhadores, sendo certo que na época da inspeção do MPT trinta trabalhadores utilizavam aqueles chuveiros.
- Quanto à lavanderia confirmo através da mesma inspeção realizada pelo autor que a empresa terceirizada, CAEL Serviços e Construções Ltda., que lava os uniformes dos empregados não está cadastrada junto ao Ministério do Trabalho e Emprego conforme exigido pelo subitem 14.1 do anexo 12 da NR-15 e ainda os empregados da lavanderia não utilizam máscara de proteção respiratório para a realização dos serviços, conforme foto 27 do documento de fl. 1250-verso.
Ainda verifico que na foto 25 de fl. 1.252 do anexo 7 os empregados da área administrativa tem acesso as áreas de exposição a poeira do processo industrial sem que seus uniformes sejam tratados com o mesmo rigor dos empregados da área produtiva.
- Quanto ao equipamento FILLER, constato que gera intensa poeira e deveria ser totalmente enclausurado, o que não ocorre, pois o sistema de exaustão é inoperante, havendo ainda vedação precária da porta principal, permitindo o escape de poeira com as fibras de amianto. As fotos de números 14/19 em fls. 1249/1249-verso do anexo 7 não deixam dúvidas quanto às irregularidades narradas pelo autor.
- No que diz respeito a descarga de material particulado e poeira apreendidos pelas máquinas de varrição industrial, as fotos 20 e 21 de fl. 1.250 do anexo 7 confirmam a dispersão da poeira coletada pela varredeira para o ambiente da fábrica, uma vez que a cabine de limpeza mencionada na foto possui dimensões menores que a varredeira opera com portas abertas.
- Em relação ao gerenciamento de resíduos, os documentos de fls. 1.010/1.015, fotos 1/13, do anexo 7, indicam dimensionamento inadequado da drenagem de efluentes nas áreas de produção industrial e gerenciamento dos resíduos (lodo/efluentes) da estação de tratamento de efluentes da lavanderia industrial.
Os documentos de fls. 1.290/1.291-verso do anexo 7 demonstram disposição de resíduos industriais contendo material particulado a céu aberto sem qualquer providência de acondicionamento adequado e ausência de controle e de destinação adequada do lodo gerado na ETE e que recebe os efluentes da lavanderia, confirmando que a ré "incorre em três irregularidades na gestão de resíduos industriais com repercussão deletéria para o ambiente laboral e para a saúde dos trabalhadores", conforme parágrafo anterior.
Por fim, os relatórios do Setor de Engenharia e Segurança do Trabalho e análise dos PPRA's apresentados a partir de março de 2012 até maio de 2014, documento de fls. 1.423/1.600 do anexo 8 e documentos 1.602/1.758 do anexo 9 deixam claro que a ré não faz avaliações quantitativas e nem monitora o real grau de exposição dos trabalhadores, sendo certo ainda que as atas de reunião da CIPA entre 2007 e 2013, contendo informações dos empregados que laboraram na ré antes da década de 90, documentos de fls. 1.925/1.946 do anexo 10, os quais deixaram evidenciado que não sabiam dos riscos a que estavam expostos."
Assim, todas essas irregularidades e todos os ilícitos constatados já descritos e detidamente analisados e fundamentados acima são suficientes à confirmação dos diversos atos ilícitos cometidos pela Ré, bem assim do dano in re ipsa, além de também ser inegável o nexo causal existente por todos os danos ao meio ambiente de trabalho e à saúde de seus atuais e ex-empregados.
A culpa é despicienda, por conta da aplicação da teoria do risco e do princípio ambiental da responsabilidade, não obstante ela também tenha se configurado na forma omissiva, especialmente por já ter ciência a Ré de todos os riscos gerados pela exposição dos trabalhadores ao Amianto, bem como porque insistiu por anos a fio em omitir as informações aos seus empregados acerca do tema, além de mesmo depois de começar a prestar tais cursos e informações, ainda assim fazê-los de forma insuficiente, como já se fundamentou acima, e permanecer a expor os seus trabalhadores antigos e atuais.
Nesse passo e por tudo o que se expôs, é patente a ofensa a direitos essenciais e caros à coletividade, especialmente ao meio ambiente de trabalho e à saúde, tornando-se plenamente justificável a compensação mediante o pagamento de indenização por dano moral coletivo, independentemente de a norma federal ainda autorizar a exploração deste mineral, pois ainda assim, frise-se, se aplica o parágrafo único do art. 927 do CC, a teoria do risco e o princípio ambiental da responsabilidade.
Quanto ao montante fixado, tendo em vista todas as circunstâncias do caso e os diversos ilícitos graves e gravíssimos causados à sociedade como um todo já extensamente fundamentadas acima, bem como o absoluto desapreço por longos anos à saúde de seus empregados e à própria ordem jurídica posta, violando diversas normas legais e coletivas, o longo período de duração dos ilícitos cometidos, o porte econômico da Ré (doc. 38 - relatório anual da Eternit de 2013, p.ex. - confirmando que a receita líquida consolidada da Ré passou de R$ 820 milhões para R$ 957 milhões, sendo 31,8% decorrente do mineral crisotila e 51,6% do fibrocimento - pg. 2313) e o caráter pedagógico punitivo da indenização, já tendo em cota inclusive o fato notório e inegável da crise econômica advinda no Brasil como um todo nos anos posteriores a tal relatório (especialmente posteriores ao final de 2014 em diante) arbitro, inclusive com fundamento no princípio da razoabilidade, em R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais) o valor da indenização a ser paga pela Ré, considerados inclusive os direitos violados e a sua gravidade, o caráter sócio-punitivo da medida ora analisada e o princípio da proporcionalidade.
REVERSÃO DOS VALORES DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS E DE ASTREINTES - JUROS E CORREÇÃO
Inicialmente, a fixação das astreintes, em cada caso e tópico, foi feita de acordo com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, com ênfase no fato de que, aliás, elas são fixadas a critério do juízo, não se vinculando em nada ao pleito exordial, por dizer respeito a multa processual.
Dito isso, todas as multas pecuniárias aplicadas e também o valor da indenização por danos morais coletivos serão revertidos a entidades e/ou projetos a serem especificados pelo Ministério Público do Trabalho, em fase de liquidação, na forma do art. 536 do CPC/15 (art. 461 do CPC/73), por alcançar melhor o resultado prático equivalente, inclusive no caso da indenização por danos coletivos.
Não incidem juros ou correção nas astreintes, por ser multa processual que pode ser revista a qualquer tempo, inclusive em fase de execução, caso se constate que se tornou ínfimo ou excessivo o valor das referidas multas processuais.
Em relação à indenização por danos morais coletivos, por sua vez, incidem juros e correção, na forma da Lei, observando-se especialmente a Súmula 439 do TST.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
As partes não agiram com nenhum ardil tampouco fraude, apenas se valendo do seu amplo direito de defesa, bem como do amplo acesso à justiça, tendo inclusive a Ré esclarecido os termos de suas declarações defensivas que levaram o MPT a vindicar tal penalidade, como se nota nos itens 77/80 da petição de ID a5aa942 - pg. 11), não havendo ali nenhuma intenção de confundir o juízo ou se beneficiar ilicitamente no processo, mas somente o animus de defesa.
Indefiro.
III- DISPOSITIVO
PELO EXPOSTO, na Ação Civil Pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - Procuradoria Regional do Trabalho/1ª Região, em face de ETERNIT S.A, decido, na exata forma dos fundamentos que integram este dispositivo para todos os fins:
- rejeitar todas as preliminares;
- condenar a Ré a:
a) proceder à substituição da matéria-prima amianto, qualquer que seja a sua variedade, por matérias-primas alternativas sem amianto na fabricação de artefatos de fibrocimento, no prazo de 18 meses a contar da sua ciência da presente decisão, sob pena de multa cominatória de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por dia de atraso;
b) desde a ciência dessa decisão e até a implementação da obrigação supra estabelecida,observar o limite máximo estabelecido no Acordo Nacional combinado com o art. 3º da Lei 9.055/95, isto é, de 0,1 f/cm³ de amianto em todos os locais de trabalho, sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a cada constatação de irregularidade, sem prejuízo das demais cominações impostas no Acordo Nacional e na própria Lei 9.055/95, ficando alterada parcialmente, nestes termos, com efeito ex nunc, a tutela de urgência anteriormente vigente;
c) desde a ciência dessa decisão, ampliar o rol de exames médicos de controle de todos os atuais e ex- empregados da fábrica no Rio de Janeiropara a inclusão dos exames de diagnóstico de neoplasia maligna do estômago (C16), neoplasia maligna da laringe (C32), mesotelioma de peritônio (C45.1) e mesotelioma de pericárdio (C45.2), sob pena de multa cominatória de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por descumprimento em relação a cada trabalhador;
d) custear, a contar da sua ciência dessa decisão, as despesas de deslocamento e as despesas de hospedagem para todos os ex-empregados da fábrica no Rio de Janeiro, que comprovadamente residirem em domicílio distante a mais de 100 km do local dos serviços médicos de realização periódica de exames médicos de controle de agravos à saúde passíveis de associação à exposição ocupacional ao amianto, sob pena de multa cominatória de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por cada descumprimento em relação a cada ex-empregado, ficando mantida a decisão de tutela anteriormente vigente;
e) pagar R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais) a titulo de indenização por danos morais coletivos.
Determino, ainda, a cassação, com efeitos ex tunc, da tutela de urgência anteriormente vigente quanto ao pedido liminar 5.2 da inicial, haja vista a improcedência do correlato pleito definitivo que lhe embasava.
A presente decisão já considerou todos os argumentos relevantes capazes de infirmar a conclusão adotada em cada item e questãode modo que aapresentação de embargos de declaração protelatórios, assim considerados aqueles que não se enquadrem nas específicas e restritas hipóteses de seu cabimento, mas que visem apenas rediscutir a decisão em si e os fatos e provas em busca de um provimento jurisdicional diverso daquele ora exarado, dará ensejo à imediata aplicação das penalidades processuais cabíveis.
Custas, pela Ré, no importe de R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais), calculadas sobre o valor de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais) ora arbitrado à condenação.

INTIMEM-SE AS PARTES E OS AMICI CURIAE.

RIO DE JANEIRO, Terça-feira, 21 de março de 2017.

MUNIF SALIBA ACHOCHE
Juiz do Trabalho 


quarta-feira, 15 de março de 2017

"Mais uma empresa do cartel brasileiro do fibrocimento (leia-se coberturas/telhas) renuncia ao uso do mortal amianto."



Dos 9 grupos empresariais do ramo de coberturas do setor de materiais de construção civil com 18 fábricas, 6 deles já fizeram acordos com o MPT de substituição e 1 renunciou espontaneamente à fibra cancerígena, num total de 12 fábricas. 


A empresa fluminense CASALITE acaba de firmar TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC) com o MPT, nesta quarta-feira (14/3), para substituição do amianto e pagamento de 500 mil reais de multa para o fundo coletivo da instituição, que financiará pesquisas, ações de educação voltadas à erradicação da fibra assassina e à preservação da vida. 

Mais detalhes estão disponíveis no site da PRT-1ª região/MPT em http://www.prt1.mpt.mp.br/informe-se/noticias-do-mpt-rj/623-mpt-rj-firma-acordo-com-empresa-para-banir-uso-de-amianto e abaixo.

Notícias da PRT1

MPT-RJ firma acordo com empresa para substituir o amianto de seus processos de produção

Acordo faz parte do Programa Nacional de Banimento do Amianto, do Ministério Público do Trabalho, direcionado para eliminar o uso do agente químico cancerígeno no Brasil.
O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) firmou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a empresa de materiais de construção Casalite, sediada em Duque de Caxias, para que deixe de utilizar amianto como matéria-prima nos processos de produção de telhas e calhas.
No acordo firmado, a empresa se compromete a substituir totalmente o amianto por fibras alternativas não nocivas para saúde humana até setembro de 2018, bem como aumentar o rol de exames de controle médico dos empregados expostos ao cancerígeno e custear despesas relacionadas ao monitoramento da saúde dos trabalhadores expostos ao amianto. Caso o acordo seja descumprido, a empresa estará sujeita ao pagamento de multa de até R$500 mil. Os valores das multas deverão ser revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
A Casalite também se comprometeu a compensar a sociedade no valor de R$500 mil, a serem revertidos para ações voltadas para a saúde dos trabalhadores e a instituições beneficentes de assistência infanto-juvenil.
“Trata-se da sexta planta industrial no Brasil que firma compromisso de substituição do amianto por fibras alternativas não nocivas à saúde humana, atendendo às diretrizes da Organização Internacional do Trabalho, que determina a substituição do amianto sempre que houver viabilidade tecnológica para isso. O acordo demonstra, de forma cabal, que no estágio de desenvolvimento tecnológico da indústria do fibrocimento no Brasil, a substituição do mineral cancerígeno é uma realidade inarredável. A continuidade do uso amianto, por outro lado, representa apenas a manutenção do interesse econômico isolado do grupo empresarial que detém o direito de exploração da única mina de amianto em atividade no Brasil, em flagrante prejuízo à saúde dos trabalhadores e ao meio ambiente geral e do trabalho”, afirmam os procuradores do Trabalho Michelle Chermont e Luciano Leivas, que negociaram o acordo.

O Programa de Banimento do Amianto no Brasil estabelece estratégias de atuação nacional para eliminar o manuseio e utilização da fibra do amianto, em todo o país, conforme determinam as Convenções 139, 155 e 162 da Organização Internacional do Trabalho, da quais o Brasil é signatário.
O programa atua, também, no monitoramento e promoção da saúde dos trabalhadores que mantêm ou mantiveram contato com a fibra ou com produtos que a contenham, exigindo, nessas hipóteses, o cumprimento da legislação federal que disciplina o aproveitamento econômico da substância declarada cancerígena pela Organização Mundial da Saúde.
Em Estados como Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Santa Catarina, há legislação específica que proíbe o uso do amianto, assim como em mais de sessenta países da comunidade internacional. Paralelamente aos processos legislativos que vêm estabelecendo sistematicamente a proibição do amianto, o MPT tem intensificado a exigência do cumprimento da legislação federal de controle ambiental, médico e epidemiológico em diversos setores da cadeia do fibrocimento com amianto, tais como distribuidores de material de construção, construção civil e transporte de resíduos.