domingo, 22 de agosto de 2010

ABREA promove lançamento de “A lã da salamandra”, com a presença do autor, em diversas capitais brasileiras



Por racismoambiental, 22/08/2010 em http://racismoambiental.net.br/2010/08/abrea-promove-lancamento-de-a-la-do-amianto-com-a-presenca-do-autor-em-diversas-capitais-brasileiras/

A ABREA – Associação Brasileira dos Ezpostos ao Amianto – convida para o lançamento nacional e sessão de autógrafos do livro “A lã da Salamandra. A verdadeira história da catástrofe do amianto em Casale Monferrato”, conforme programação abaixo, com a presença do autor, o jornalista italiano, Giampiero Rossi, acompanhado por Nicola Pondrano e Bruno Pesce, protagonistas desta história real que conta a tragédia promovida pela Eternit na pequena cidade de Casale Monferrato, na região do Piemonte, no norte da Itália.

Algumas informações sobre o amianto, as datas dos diversos lançamentos e uma resenha do livro podem ser lidos a seguir.
Sobre o amianto
O amianto, conhecido da humanidade desde a antiguidade, já foi considerado o mineral mágico. Conta a lenda que era chamado a “lã da salamandra”, o lagarto mítico que era capaz de atravessar o fogo sem qualquer dano. A partir do século XX descobriu-se que, apesar de suas excelentes propriedades tecnológicas de não ser destruído pelo fogo, nem pelo ataque químico ou biológico e ser mais resistente do que o próprio aço, quando tracionado, era um potente cancerígeno e agente fibrogênico para os seres humanos. Por isSo, o amianto, por mais de um século, tem sido uma preocupação tanto nas nações desenvolvidas como naquelas em desenvolvimento. Banido em 58 países, foi a Itália a protagonista do banimento total da fibra cancerígena, que desencadeou um efeito dominó, que estendeu esta decisão por todos os membros da União Européia.

O Brasil continua sendo um dos maiores produtores mundiais do minério cancerígeno, embora 4 estados da federação brasileira e vários municípios já o tenham proibido.

Mesmo tendo banido o amianto, desde 1993, a Itália ainda enfrenta o “desespero” do câncer em virtude das doenças relacionadas serem de longa latência, isto é, são diagnosticadas mais de 30 anos após o primeiro contato com as fibras. Isto atemoriza a população e as autoridades sanitárias e previdenciárias/securitárias daquele país.

Itália e Brasil têm histórias muito similares quanto ao uso do amianto, já que a Itália foi a maior produtora do minério na Europa ocidental e um dos grandes fabricantes e consumidores de produtores de fibrocimento por quase um século, como ainda ocorre no Brasil, que ocupa lugar de destaque no cenário geopolítico mundial da produção, comercialização, exportação e utilização do minério cancerígeno.

Que o exemplo de luta e resistência dos trabalhadores e da população de Casale Monferrato, transcrito neste livro, sirva de inspiração a todos que tiverem a oportunidade de ler esta emocionante e sofrida obra literária que a ABREA tem o orgulho de publicar no Brasil com apoio de diversas entidades que abraçaram esta mesma causa socioambiental.

Programação do Lançamento

30/08 – Brasília – 18 horas – HOTEL ROYAL TULIP BRASÍLIA ALVORADA. Iniciativa: ABREA, ANPT e ANAMATRA

01/9/2010 – Maceió – 19 horas- Sindicato dos Petroleiros de Sergipe e Alagoas. Iniciatia e apoio do Sind. dos Petroleiros/SE e AL

02/9/2010 – Salvador – 10 horas – Simões Filho (região metropolitana de Salvador). Iniciativa: ABEA-Associação Baiana dos Expostos ao Amianto

03/9/2010 – Rio de Janeiro – 10 horas – AUDITÓRIO DA REITORIA / TÉRREO – UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO DE JANEIRO (UERJ). Iniciativa e apoio: ABREA/RIO, FIOCRUZ/CESTEH, UERJ e assessoria do deputado estadual Carlos Minc 03/9/2010 – Osasco – 19 horas – Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco. Iniciativa e apoio: Sind. Metalúrgicos de Osasco, ABREA, CEREST e assessoria dos Vereadores Rubinho de Osasco e do Deputado Marcos Martins

RESENHA DO LIVRO:

La Lana della Salamandra, por Silvia de Bernardinis (historiadora e antropóloga italiana, doutoranda da Universidade de São Paulo do Departamento de História)

“[...] era até amena de se ver, leve como um talco, sutil como a areia de certas praias tropicais”. São as palavras de Romana, uma mulher – irmã, esposa, mãe, avó – que se vê em poucos anos privada de seus afetos – levados embora brutalmente pela poeira branca e mortal que desde 1906 irrompeu na paisagem de Casale Monferrato – cidade do norte da Itália – até tornar-se seu traço constitutivo. A história de Romana Blasotti, mulher símbolo da luta de Casale contra a fábrica de amianto Eternit, presidente desde 1988 da Associação dos Familiares das Vítimas do Amianto, abre o livro de Giampiero Rossi, La Lana della Salamandra, que reconstrói as etapas principais de trinta anos de batalhas travadas pelos trabalhadores da fábrica e pela comunidade local contra a multinacional helvético-belga.

A instalação da fábrica muda a vida e o destino de todos os seus habitantes, não apenas dos trabalhadores da Eternit – operários, dirigentes e funcionários sem distinção de classe – mas também das crianças que brincam nos parques e nas ruas ao redor dela, do funcionário de banco, do padeiro, dos quem nunca pisaram na fábrica, mas que respiraram o ar envenenado pelas fibras de amianto espalhadas na atmosfera.

Oitenta anos de atividade (a indústria fechou em 1986) e 2272 mortos até hoje só em Casale, o epicentro italiano da tragédia do amianto, e infelizmente o balanço está destinado a aumentar nos próximos dez anos, Como indicam as pesquisas epidemiológicas.

A presença da fábrica de amianto Eternit fora recebida como uma bênção, representando o progresso, a possibilidade de uma perspectiva de vida mais estável para uma área que até então vivia de agricultura. Nada se sabia sobre a toxicidade do amianto pelo menos até a década de sessenta, e quando os resultados das investigações cientificas comprovaram os efeitos letais provocados pela exposição às fibras de amianto, a notícia não foi divulgada e pouco ou nada mudou em termos de segurança na vida das fábricas espalhadas pelo mundo. Material barato, resistente e versátil, o amianto garantia um retorno econômico mais importante do que a vida humana.

A história pessoal de lutos de Romana cruza com a de dois trabalhadores, amigos e colegas de Mario, marido dela, operário da Eternit morto por mesotelioma pleural, o câncer causado pela exposição ao amianto. Os dois trabalhadores, Bruno Pesce e Nicola Pondrano, representantes sindicais da CGIL, que assistem ao adoecimento e à morte causada pela mesma doença de tantos companheiros de trabalho decidem, quase que quixotescamente, desafiar o colosso Eternit.

Com um trabalho paciente e persistente, eles investigam e descobrem os nexos entre a exposição ao mineral e os casos de câncer, evidência sempre negada pelos responsáveis da Eternit pelos quais não havia nenhum tipo de risco para a saúde dos trabalhadores expostos ao amianto; enfrentam a resignação dos trabalhadores – assustados pelo espectro da demissão agitado pela empresa que, apesar de tudo, garante o salário e alguma indenização -, superam as tentativas de divisão e de desmobilização da luta, e abrem progressivamente brechas na sociedade para tornar o problema do amianto e do direito à salvaguarda da saúde nos lugares de trabalho uma questão de justiça e uma batalha em favor da dignidade humana.

Em poucas densas páginas, a reconstrução dos dramas individuais, escondidos e quase negados inicialmente, a lenta tomada de consciência coletiva, a dor e as lutas que saem da porta da fábrica para se tornarem denúncia e bandeira coletiva de uma comunidade – protagonista de uma batalha histórica contra o amianto e contra um império econômico-financeiro que enquanto tal parecia ser invencível.

Pouco a pouco Casale alcança todas suas reivindicações: o fechamento da fábrica, as leis que proíbem o uso do amianto e o reconhecimento dos direitos de assistência médica e econômica das vitimas e de seus familiares, os processos e as condenações dos dirigentes locais da empresa e, finalmente, o salto de qualidade, a chamada em causa dos donos, os herdeiros da dinastia Schmidheiny e o barão Jean Marie Ghilslain de Cartier de Marchienne, apontados pelo procurador da República italiana Raffaele Guariniello – empenhado desde os anos Oitenta na defesa dos direitos trabalhistas – como diretos responsáveis pelas 2969 mortes causadas pela “lã da salamandra” na Itália, nos quatro estabelecimentos presentes no território, com a acusação de não ter divulgado as informações sobre a nocividade do mineral e de não ter aplicado as normas necessárias à salvaguarda da vida dos trabalhadores e da população.

Giampiero Rossi consegue reconstruir e individuar a particularidade da batalha de Casale – que hoje é referência mundial para todos que lutam pelo banimento do amianto no mundo e pelo respeito e a salvaguarda da saúde no trabalho – e que ele resume como a “estratégia do caracol”, um trabalho paciente e tenaz levado adiante inicialmente pelo sindicato, cujo papel se torna emblemático pela sua capacidade de superar o caráter inicial de simples, ainda que necessária e importante luta sindical, através de uma conscientização progressiva da comunidade local e da sociedade italiana, uma luta que se torna vitoriosa por sua capacidade de agregar e aglutinar os mais diversos setores da sociedade civil, advogados, promotores de justiça, médicos, políticos e funcionários públicos, ambientalistas, cada qual contribuindo parcial e decisivamente no assalto ao gigante.

Mas não se esgota apenas aqui a lição da batalha de Casale. A ela devemos reconhecer o mérito de ter posto ao centro de sua estratégia não apenas os valores fundamentais do direito ao trabalho e da defesa do emprego, mas também a garantia da segurança e da preservação da vida e da saúde do trabalhador que é paradigmaticamente individuada como conditio sine qua non do trabalho, quando morrer pelo trabalho e por suas conseqüências dele era um necessário tributo a ser pago a uma concepção cega e limitada da idéia de progresso, ao lucro desenfreado, a uma modernização sem modernidade, incapaz de respeitar o valor da vida humana e do meio-ambiente – um tributo que ainda hoje tantas pessoas pagam nas áreas mais pobres do planeta.

Esta batalha de pioneiros contra a barbárie de uma visão deformada dos valores humanos e a favor da civilização, muito nos ensina e muito pode ajudar aos quem ainda hoje lutam para o reconhecimento de direitos básicos dos trabalhadores.

O balanço desta luta iniciada há trinta anos chega agora ao seu ato final graças à determinação do Procurador Raffaele Guariniello. É difícil prever qual será o êxito do processo penal movido contra os donos da Eternit, mas de qualquer forma Romana e todos os protagonistas da guerra contra o amianto poderão dar um rosto àquele poder que parecia invisível e inalcançável.

A LÃ DA SALAMANDRA. A VERDADEIRA HISTÓRIA DA CATÁSTROFE DO AMIANTO EM CASALE MONFERRATO, de Giampiero Rossi, São Paulo, 2010.