PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª. REGIÃO
1ª. VARA DO TRABALHO DE SÃO CAETANO DO SUL –SP
Processos Nº. 1000807-12-2013-5-02-0472 e 1000799-38-2013-5-02-0471 Rito: Ordinário
1ª. Reclamante: Helenice Macieri Bellaz (proc. 1000807-12-2013-5-02-0472)
2º. Reclamante Jeanilson Bellaz (proc. 1000807-12-2013-5-02-0472)
3º. Reclamante: Espólio de João Batista Bellaz (proc. 1000799-38-2013-5-02-0471)
Reclamada: Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda.
SENTENÇA EM AÇÃO INDENIZATÓRIA
I - RELATÓRIO:
Trata-se de reclamação trabalhista proposta por Helenice Macieri Bellaz e Jeanilson Bellaz em trâmite nos autos de nº. 1000807-12-2013-5-02-0472, bem como proposta por Espólio de João Batista Bellaz (proc. 1000799-38-2013-5-02-0471), em face de Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda., em que alegam que seu familiar, Sr. João Batista Bellaz, foi admitido perante a reclamada em 21.11.1974 e dispensado sem justa causa em 05.02.1990.
Afirmam que o Sr. João Batista, marido da 1ª. Reclamante e pai do 2º. Reclamante faleceu em razão de doença profissional adquirida em face da exposição às fibras de amianto.
Aduzem que a Reclamada, quando constatada a existência da doença, formalizou acordo extrajudicial para isenção de obrigações. Entendem pela nulidade da avença, em face das péssimas condições de saúde do “de cujus” e renúncia de direitos.
Pretendem: declaração da nulidade do acordo extrajudicial firmado; indenização por danos morais e materiais experimentados pelo “de cujos” a partir do momento em que descobriu ser portador do tumor maligno degenerativo denominado “mesotelioma pleural” até a consumação do de seu óbito, ocorrida em 9.3.2013; reparação dos danos materiais e morais experimentados pelos reclamantes (viúva e filho do Sr. João Batista Bellaz) ante o óbito deste último, ocorrido em 9.3.2013; benefício da justiça gratuita; honorários de sucumbência.
Deram a cada causa o valor de R$ 40.000,00.
Preliminarmente, a Reclamada alega a inépcia da inicial, incompetência da Justiça do Trabalho, ilegitimidade ativa, falta de interesse de agir, eficácia geral do acordo realizado.
Como prejudicial do mérito argui a prescrição total.
No mérito, pugna pela improcedência da ação sob o fundamento de validade do acordo realizado, bem como em razão da ausência de culpa, nexo causal e dano.
Aberta a audiência inaugural e infrutífera a primeira proposta de conciliação, foi determinada a realização de prova pericial indireta.
Houve apresentação de laudo técnico e manifestação das partes.
Aberta a audiência de instrução, foi ouvido o depoimento pessoal da 1ª. Reclamante.
Sem outras provas, encerrou-se a instrução processual.
Razões finais escritas pelas partes.
Infrutífera a 2ª. proposta de conciliação.
É o Relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO:
PRELIMINARES
Da Competência da Justiça do Trabalho
Entende a Reclamada pela incompetência desta Especializada para julgar a presente, sob alegação de que a pretensão quanto a indenização por danos morais em nome próprio da 1ª. e 2º. Reclamante não decorrem da relação de trabalho.
Sem razão.
Compulsando os autos, evidencia-se que a pretensão da viúva e filho do de cujus decorrem do óbito deste último, ocorrido em 9.3.2013, em decorrência do tumor maligno ocupacional, sendo, incontroverso a competência desta Especializada para processamento e julgamento da demanda, por decorrer da relação de trabalho, nos exatos termos do art. 114, VI e IX da CF e Súmula 392 do C. TST.
Rejeita-se, portanto, a preliminar.
Da Legitimidade Ativa
No que tange a legitimidade da primeira e segundo Reclamantes, cumpre consignar a análise em audiência id n. Num. 2593182 - PÁg. 1, nos autos do processo 1000807.12.2013.5.02.0471, o que ora se ratifica a legitimidade.
No que tange a legitimidade do Espólio, rejeita-se, considerando o entendimento deste Juízo de que embora a violação moral atinja apenas os direitos personalíssimos, a respectiva indenização patrimonial transmite-se aos sucessores com o falecimento do titular do direito.
Nesse sentido a posição dominante do C. TST:
“LEGITIMIDADE ATIVA DO ESPÓLIO - DANOS MORAIS E MATERIAIS. 1. Consoante a norma inserta no art. 943 do Código Civil, o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança. 2. Logo, o espólio tem legitimidade ativa para propor ação de indenização por danos morais e materiais, porquanto trata-se de reparação cuja natureza é patrimonial e decorrente do contrato de trabalho. Isso porque o que se transmite é o direito de ação e não o direito material em si, este de natureza personalíssima do empregado falecido. 3. Assim, a decisão regional que considerou o Espólio Autor parte ilegítima para propor a presente demanda violou o dispositivo legal em comento. Recurso de revista provido. ( RR - 151000-43.2009.5.08.0015 , Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 29/02/2012, 7ª. Turma, Data de Publicação: 02/03/2012)”
Rejeita-se, portanto, a preliminar.
Da Inépcia da Petição Inicial
A Consolidação das leis Trabalhistas, no art. 840, § 1º, em face o princípio da informalidade e simplicidade do processo trabalhista, exige do Autor da ação apenas um breve relato dos fatos e o pedido, sendo certo que tal exigência foi, satisfatoriamente, cumprida pelos Reclamantes, como se evidencia da petição inicial.
Ora, restou incontroverso nos autos que os Reclamantes pretendem indenizações por danos materiais e morais tanto em decorrência da moléstia profissional adquirida pelo Reclamante nas dependências da Reclamada e por sua culpa, como em face da morte do Empregado pela mesma causa de pedir.
Ademais, restou evidente que a Reclamada conseguiu exercer o contraditório e a ampla defesa, no particular.
Dessa forma, rejeita-se a preliminar.
Da Carência da Ação – Do Interesse Processual
O interesse de agir depende do binômio necessidade, utilização e adequação.
Como as demais condições da ação, o interesse de agir deve ser analisado abstratamente na aferição da viabilidade do pedido submetido ao Judiciário, à vista do que se alega pela parte interessada.
No caso dos autos, a pretensão de declaração de nulidade de indenização trabalhista extrajudicial e a condenação em indenização, demonstram o atendimento ao binômio necessidade-adequação, pois, a postulação em juízo é o único instrumento pelo qual o Reclamante pode ver satisfeita a sua pretensão.
Rejeita-se, portanto, a preliminar.
Da Eficácia Geral da Quitação do Acordo
A matéria arguida em sede de preliminar confunde-se com o mérito e com este, será analisada.
PREJUDICIAL DE MÉRITO
Prescrição Total
Argui a Reclamada a prescrição total quanto ao pedido de indenização.
Sem ração a Reclamada.
Primeiramente cumpre esclarecer que não há que se cogitar em prescrição eis que o cômputo do prazo prescricional, em se tratando de doença profissional superveniente a extinção do contrato de trabalho, inicia-se a partir da ciência inequívoca do dano.
Neste exato sentido tem ventilado a jurisprudência do C. TST:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. 1. PRESCRIÇÃO. MARCO INICIAL. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA LESÃO. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a fluência do prazo prescricional tem início com a ciência inequívoca da lesão, a qual não se confunde com o simples conhecimento da doença ou com a concessão do primeiro afastamento previdenciário, já que não evidenciam a certeza e a extensão do dano. In casu, considerando que a ciência inequívoca da lesão ocorreu em 30/10/2009, conforme registrado no acórdão regional, e a reclamação trabalhista foi ajuizada em 3/3/2010, não há prescrição a ser pronunciada, sendo irrelevante a discussão acerca da aplicação do prazo prescricional cível ou trabalhista. Incólumes, portanto, os arts. 7., XXIX, da CF e 206, § 3º., V, do CC. 2. REINTEGRAÇÃO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA ACIDENTÁRIA (...)
(AIRR - 153-58.2010.5.04.0030 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 26/03/2014, 8ª. Turma, Data de Publicação: DEJT 28/03/2014)”
Assim, considerando que o falecido somente tomou conhecimento de sua enfermidade em 29.07.2011 conforme documentos médicos carreados nos autos e ação proposta em 25.07.2013, não há que se falar em prescrição.
MÉRITO
Da Nulidade do Acordo Extrajudicial
Alegam os Reclamantes que o acordo firmado com a Reclamada é nulo de pleno direito eis que viola vários institutos legais.
A Reclamada pugna pela validade do instrumento.
Pois bem.
Capazes as partes e lícito o objeto, reputa-se válida a transação que alcance direitos decorrentes de extinto contrato de trabalho, não se podendo ignorar aspecto que integra o negócio jurídico e que equilibra, por vontade das partes, as concessões recíprocas.
Entretanto, o termo de transação que consta nos autos, foi firmado quando o “de cujus” encontrava-se em estado terminal e em péssimas condições de saúde e sua família em situação de pleno desespero, não podendo ser avalizado por este órgão.
Atente-se que em que pese o instrumento de transação esteja datado em março de 2012, os demais documentos, quais sejam, a Comunicação do Acidente do Trabalho (CAT) ao INSS e o cheque no valor de R$ 163.207,07, nominal ao “de cujus”, evidenciam a veracidade do depoimento pessoal da 1 Reclamante de que o instrumento só fora pactuado em 27.12.2012, as vésperas do falecimento que ocorrera em 09.03.2013, ratificando, repita-se, a tese quanto a aceitação do pacto em face do gravíssimo estado de saúde e debilidade do antigo Empregado.
Ora, conferir ao ex-trabalhador suposto termos de concessões mútuas as vésperas de seu falecimento causado por culpa da Empresa, com cláusulas que evidenciam a expressa renúncia irrevogável de direitos indisponíveis, não pode ser acolhido por este Juízo, por atentar contra boa fé e lisura contratual e ir de encontro com equilíbrio das relações contratuais.
Cumpre consignar ainda que a Reclamada, no intuito de mascarar a lisura do pacto, tenta induzir o leigo a erro quanto viabiliza a possibilidade do “EXAMINANDO” discutir as cláusulas e classificações da doença, sem o possibilitar, no entanto, qualquer represália ou intenção de ordem patrimonial.
Mais uma vez surpreende-se o Juízo com a má-fé contratual da Reclamada em levar o “EXAMINANDO” a erro, que diante da situação que se encontrava foi “obrigado”, à beira da morte a assinatura do pacto.
Assim, a evidencia do desequilíbrio da avença e conduta que beira ao abuso de direito, entende-se, nos termos do art. 9. da CLT, nulo de pleno direito os termos da avença no que tange a renúncia de direitos trabalhistas, entendendo-se, no entanto, que eventual valor conferido na presente, a título de indenização, poderá ser compensado com o valor comprovadamente recebido pelo “de cujus”, quando da assinatura da avença.
Do Amianto/ Da Doença Ocupacional
Alega os Reclamantes que o “de cujus” laborou para a Reclamada no período de 21.11.1974 a 05.02.1990, sempre exposto, de forma contínua à poeira do mineral notoriamente cancerígeno denominado “amianto” ou “asbesto” em sua antiga unidade fabril localizada no município de São Caetano do Sul-SP.
Em defesa, a Reclamada sustenta, em síntese, que não pode ser responsabilizada pela patologia noticiada, eis que a responsabilidade pela ocorrência de doença profissional é subjetiva e as práticas do processo produtivo sempre pautaram pela garantia de ambiente seguro e saudável nas suas instalações.
De plano, cumpre consignar que em face de diversos estudos técnicos realizados, inclusive acostados nos presentes autos, a exposição do ser humano às fibras de amianto ocasionam sérios problemas de saúde. Atente-se que as ocorrências ficam embutidas no organismo e quando aparecem evidenciam a gravidade da lesão e intensidade da insalubridade do agente.
Registra-se ainda, por amor a repetição, que como de notório conhecimento, a utilização do mineral fora proibida em diversos países e em algumas cidades do Brasil, tendo, atualmente, diversas discussões sobre a possibilidade de banimento do produto, em face, repita-se, dos conhecidos prejuízos à saúde do ser humano.
Analisando toda documentação acostada aos autos percebe-se que o “de cujus” em 29.7.2011 foi diagnosticado pelo Serviço de Anatomia Patológica do Hospital do Servidor Público Estadual com “mesotelioma epitelial”, vindo tal resultado a ser confirmado em nova biópsia concluída em 8.8.2011 (laudo em anexo) e em exame realizado pelo serviço de pneumologia da FUNDACENTRO em 29.9.2011 (em anexo).
Atente-se que os referidos documentos em conjunto com exames do falecido foram analisados pela Sra. Perita que concluiu de forma extremamente técnica e elucidativa que havia nexo causal direto do mesotelioma epitelial com o trabalho do “de cujus”, em face da sua exposição ao agente “amianto”.
Atente-se que a Sra. Perita foi esclarecedora, inclusive, quanto à ausência de fornecimento adequado de Equipamentos de Segurança, caindo por terra a frágil alegação da Reclamada quanto à preservação da saúde do trabalhador.
Ora, incontroverso a existência de doença ocupacional, que ocasionou a morte do ex-funcionário (causa mortis), resta evidente a ocorrência do dano - morte da vítima-, e; o nexo causal direto, já que o dano decorreu em razão da exposição do empregado ao mineral altamente prejudicial à saúde (causa) e a doença (efeito), art. 19 da Lei 8.213/91.
Entretanto, por amor ao debate e, em face da alegação da Reclamada quanto à necessidade de análise da culpa, para aferir a sua responsabilidade (o que não se aplicaria, no caso concreto, por entender este Juízo que a Empresa possui evidente responsabilidade objetiva, em face do notório conhecimento quanto à natureza insalubre do mineral), passa-se a analisar o conjunto probatório para aferir se a Empresa desincumbiu do ônus de comprovar a inexistência da sua culpa, e, por via de consequência, a exoneração da responsabilidade civil.
De plano, registra-se o cabimento quanto à análise do respeito por parte da Reclamada das normas de segurança e saúde.
Ora, o ônus da prova cabe à Empresa, sendo interessante transcrever o entendimento do C. TST:
“Indenização por danos morais – acidente de trabalho. Na apuração da responsabilidade civil em decorrência do acidente do trabalho, o ônus da prova recai sobre o empregador, que deve comprovar a inexistência da conduta culposa. Entretanto, não se desonerando do encargo que milita em seu desfavor, presume-se a culpa, surgindo o consequente dever de indenizar o trabalhador pelo prejuízo sofrido. TST. 3ª. Turma. RR. 84.813/2003-900-03-00.2, Rel.: Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ 15set. 2006.”
A Constituição Federal de 1988 conferiu a toda a sociedade a garantia da vida e da integridade física e psíquica.
Nesse sentido, os artigos 225, 200, VIII, e 7º., XXII, da CF garantiram aos trabalhadores o direito de exercerem as suas atividades num ambiente de trabalho equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida, e; a obrigatoriedade dos empregadores de reduzir os riscos inerentes ao trabalho, através de normas de saúde, higiene e segurança.
Assim, deve a empresa instruir os empregados, através de ordens de serviços, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes de trabalho nos termos do art. 157, II da CLT, bem como proporcionar treino, orientação e preparo para o desempenho das atividades.
Consigne-se que não basta à empresa fornecer orientações e equipamentos de individuais e coletivos de segurança, o art. 157, I da Consolidação das Leis Trabalhistas determina que cabe às empresas cumprir e fazer cumprir as normas legais de segurança e medicina do trabalho.
Deixando de agir em conformidade com as normas legais que objetivem eliminar ou diminuir os riscos do ambiente laboral, e até mesmo se omitindo, por dolo ou culpa, na fiscalização, prevenção e exigência de cumprimento da legalidade, o ente empresarial comete ato ilícito, passível de responsabilidade.
Registre-se que a responsabilização do empregador não decorre do perigo da atividade exercida pelo obreiro, mas sim do seu descumprimento de normas de segurança e/ou falta de fiscalização ao meio ambiente de trabalho.
Nesse sentido, pode-se dizer que a culpa do ente empresarial reside na inobservância do dever de cautela, ou culpa contra a legalidade.
Importante observar as lições do Excelentíssimo, Sebastião Geraldo de Oliveira1:
A simples violação de uma dessas normas, havendo dano e nexo causal, cria a presunção de culpa do empregador pelo acidente do trabalho ocorrido, uma vez que o descumprimento da conduta normativa prescrita já é confirmação de sua negligencia, a ilicitude objetiva ou culpa contra a legalidade.
No caso dos autos, restou evidenciado que durante mais de 15 (quinze) anos o “de cujus”, ficou exposto às fibras de amianto, sem a devida proteção.
Atente-se que a classificação do amianto a que ficou exposto o ex-empregado não impediu o aparecimento da doença, ao contrário, diversos estudos apontaram que o mineral é tão devastador que o mínimo de exposição acarretam a doença.
Ademais, repita-se a Reclamada, diferentemente do alegado em defesa não comprova ações minimizadoras e preventivas da exposição do ex- empregado ao “asbesto”.
Assim, evidenciada a ausência de provas quanto à diligência necessária para exoneração da responsabilidade, cabível a responsabilidade da Reclamada.
Do Dano Material - Pensão
Nos termos do art. 948 do Código Civil, cabe a indenização por danos materiais, na forma de pensão, às pessoas a quem o morto os devia.
Sabendo que a natureza jurídica da pensão decorrente de ato ilícito possui o objetivo de reparar o prejuízo da perda da renda familiar, e, verificando que a Requerente dependia economicamente da vítima, eis que era esposa do falecido e dependente legal conforme faz prova o documento previdenciário anexado aos autos, defere-se o pedido de indenização desde a data do óbito na forma de pensão fixada em 2/3 dos rendimentos recebidos pela vítima, nos termos das variações salariais da sua categoria profissional presumindo-se que 1/3 representava as despesas pessoais da vítima. Tudo, nos termos da jurisprudência do STJ:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE DA ESPOSA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DO MARIDO. VALORAÇÃO DA PENA. PRESUNÇÃO LEGAL. CC, ART. 231-III. PROVA DA DEPENDÊNCIA. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. RISTJ, ART. 257. DEDUÇÃO DE 1/3(UM TERÇO) DA PENSÃO. GASTOS PRÓPRIOS DA VÍTIMA. (…)
I - É comum nas famílias de baixa renda haver dependência econômica entre os cônjuges, notadamente em razão de ser sobremaneira difícil a sobrevivência da família com o salário de apenas um deles, sendo certo, ademais, que a assistência econômica prestada por um dos cônjuges ao outro goza de presunção legal de existência (art. 231, III, CC).
II - Segundo a boa doutrina, "os danos materiais e morais causados aos parentes mais próximos não precisam de prova, porque a presunção é no sentido de que sofrem prejuízos com a morte do parente".
III - Os alimentos a que se refere o art. 1537-II, CC, não se identificam com os previstos no Direito de Família.
IV - Afigura-se razoável e justo fixar a indenização em 2/3(dois terços) da renda da vítima, deduzindo um terço (1/3) correspondente ao que essa, por presunção, despenderia com seu próprio sustento.
(…)
(REsp 157.912/RJ, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 04/08/1998, DJ 21/09/1998, p.188)
Ressalta este Juízo que, em face da natureza ressarcitória do instituto, para o cálculo da indenização também deverão ser incluídas o valor relativo ao 13º. salário pelo seu duodécimo mais o acréscimo de 1/3 sobre o direito às férias de todo o período concedido, com o intuito de retratar a fidelidade dos possíveis ganhos que efetivamente a vítima aferiria, evitando-se o enriquecimento sem causa da empresa.
Para o cálculo do período da pensão deverá ser levado em consideração a idade em que a vítima tinha na data do falecimento menos a expectativa de vida prevista pelo IBGE para atingir a diferença de anos devida pela indenização.
Defere-se ainda o pagamento da indenização de uma só vez, nos termos do artigo 950 do Código Civil.
Esclareça-se, por ser oportuno, que este Juízo comunga do entendimento preconizado na súmula 229 do C. STF, sendo que o recebimento de benefício previdenciário não obsta o recebimento quanto a indenização de natureza civilista.
Da Indenização por Dano Moral
A questão do dano moral tem assumido relevância no âmbito do Direito do Trabalho diante da elevação da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho ao patamar dos fundamentos do "Estado Democrático de Direito" (art. 1º., incisos III e IV), acrescentando que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação" (art. 5º., inciso X).
Dessa forma, comprovada existência da doença ocupacional e a culpa da Reclamada, o dano moral é presumido.
Isso porque, este Juízo filia-se à corrente que defende que tal dano existe in re ipsa, cuja prova se dispensa dada a sua impossibilidade de concreção, bastando, para tanto, a comprovação do ato ilícito (art. 186 c/c art. 189, ambos do CC/02).
A corrente ora defendida entende que a configuração do dano moral não depende de prova da dor, do sofrimento para que se configure a obrigação de indenizar.
No dizer de Sérgio Cavalieri Filho 2: “o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto, está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum”
O ato ilícito da Reclamada ficou demonstrado no tópico anterior, diante da negligência quanto à segurança e saúde do ex-empregado.
Ademais, a perda da saúde com a consequente impossibilidade de recuperação, como é o caso dos autos, afeta o ser humano e a família em seu patrimônio ideal, causando-lhe prejuízos naquilo que tem de mais precioso, sua saúde e a perda do ente querido.
Fixação do quantum:
A fixação do quantum relativo ao dano moral proveniente do acidente de trabalho deve observar, primordialmente, a extensão do dano e a situação fática vivenciada pelas partes, assim como a capacidade econômica da reclamada e o caráter pedagógico da medida, de modo a prevenir a ocorrência de futuros casos de lesão.
Nesse sentido, considerando a morte da vítima e sabendo que a Reclamada possui capacidade econômica para arcar com as indenizações decorrente de sua negligência em face de falta de fiscalização do ambiente de trabalho e, ainda com o com o intuito de alertar o infrator para as consequências do desrespeito às regras de segurança e saúde do trabalho, defere-se, a indenização no montante de R$500.00,00 ao espólio, R$500,00 a Primeira Reclamante (viúva do “de cujus”) e R$ 500.000,00 ao Segundo
Reclamante (filho do “de cujos”), os dois últimos em face do dano em “ricochete”.
Dos Honorários Periciais
Diante da sucumbência na pretensão relativamente objeto da perícia realizada nos autos, condena-se a Reclamada ao pagamento de honorários periciais (CLT, 790-B), cujo valor fixo em R$ 2.500,00.
O valor dos honorários periciais deverá ser atualizado monetariamente até a data do efetivo pagamento de acordo com o art. 1º. da Lei n. 6.899/1981, sobre ele incidindo juros de mora igual ao dos créditos trabalhistas.
Dos Honorários Advocatícios
Improcede, pois não preenchidos os requisitos da Lei 5584/70, inteligência das Súmulas 219 e 329 do TST.
Improcede ainda, nos termos da súmula 18 do E. TRT da 2ª. Região.
Do Benefício da Justiça Gratuita
Tendo sido preenchidos os requisitos delineados no artigo 790, § 3º., da CLT, defere-se o benefício da justiça gratuita aos Autores.
Das Contribuições Previdenciárias e Fiscais
No caso dos autos, havendo condenação meramente em indenização por danos morais e materiais, entende-se como hipótese de não-incidência tributária.
Dos Juros e da Correção Monetária – Danos Morais e Materiais
Para a indenização por dano material, o termo inicial da correção monetária é a data do conhecimento do evento danoso, qual seja, 29.07.2011, data do conhecimento da doença.
Os juros e correção monetária referentes à indenização por danos morais deverão observar os critérios elencados na Súmula 439, do C. TST.
III – DISPOSITIVO
Pelo exposto e tudo o mais que dos autos consta, a 1ª. Vara do Trabalho de São Caetano do Sul REJEITA AS PRELIMINARES E PREJUDICIAL DE MÉRITO e JULGA PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos constantes na reclamatória trabalhista ajuizada por Helenice Macieri Bellaz, Jeanilson Bellaz e Espólio de João Batista Bellaz, para condenar a reclamada Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda. ao pagamento das seguintes verbas:
1) pensão mensal vitalícia em favor da Reclamante Helenice Macieri Bellaz no montante de dois terços (2/3) dos rendimentos recebidos pela vítima, corrigidos nos termos das variações salariais da sua categoria profissional, ressaltando que em face da natureza ressarcitória do instituto, para o cálculo da indenização também deverão ser incluídas o valor relativo ao 13º. salário pelo seu duodécimo, mais o acréscimo de 1/3 sobre o direito às férias de todo o período concedido, com o intuito de retratar a fidelidade dos ganhos que efetivamente a vítima aferia, evitando-se o enriquecimento sem causa da Empresa.
Para o cálculo do período da pensão deverá ser levado em consideração a idade em que a vítima tinha na data do falecimento menos a expectativa de vida prevista pelo IBGE, para atingir a diferença de anos devidos pela indenização.
Defere-se ainda o pagamento da indenização de uma só vez, nos termos do art. 950 do CC, improcedendo, portanto, a constituição de capital, nos termos do artigo 475-Q, § 1º., do CPC.
2) indenização por danos morais no montante de R$500.00,00 ao espólio, R$500,00 a Primeira Reclamante (viúva do “de cujus”) e R$ 500.000,00 ao Segundo Reclamante (filho do “de cujos”), os dois últimos em face do dano em “ricochete”, totalizando o montante de R$ 1.500.000,00.
Autoriza-se a compensação do valor percebido no instrumento particular de transação.
Não haverá incidência de contribuições previdenciárias e fiscais sobre os danos materiais e morais, ora deferidos, em razão da natureza indenizatória das verbas.
Os honorários periciais deverão ser arcados pela Reclamada, parte sucumbente no objeto da perícia, no montante de R$ 2.500,00.
O valor dos honorários periciais deverá ser atualizado monetariamente até a data do efetivo pagamento de acordo com o art. 1º. da Lei n. 6.899/1981, sobre ele incidindo juros de mora igual ao dos créditos trabalhistas.
Para a indenização por dano material, o termo inicial da correção monetária é a data do conhecimento do evento danoso, qual seja, 29.07.2011, data do conhecimento da doença.
Os juros e correção monetária referentes à indenização por danos morais deverão observar os critérios elencados na Súmula 439, do C. TST.
Defere-se o pedido de Justiça Gratuita.
Improcedem os demais pleitos.
Tudo nos termos da fundamentação, que integra o presente dispositivo.
Remeta-se a cópia desta à Procuradoria da Fazenda Nacional, nos termos da Recomendação conjunta GP.CGJT 02/2001.
Expeça-se ofício à DRT.
Custas pela Reclamada, calculadas sobre o valor atribuído à condenação de R$ 2.000.000,00, no importe de R$ 40.000,00.
Intime-se as partes.
TARCILA DE SÁ SEPÚLVEDA ARAÚJO
Juíza do Trabalho Substituta
1 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente de Trabalho, ou Doença Ocupacional. Editora LTR, 2008, p.g 161.
2 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a:
[TARCILA DE SA SEPULVEDA ARAUJO]
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