16/05/2011
Um vendedor de telhas e caixas d’água, empregado da Eternit, vai receber R$ 300 mil de indenização por danos morais mais pensão mensal vitalícia por ter adquirido câncer pulmonar decorrente da aspiração constante de pó de amianto, utilizado na fabricação dos produtos que ele vendia. O pedido, negado pela Vara do Trabalho de São José do Rio Preto (SP), foi concedido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT/SP) e mantido pela 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
O vendedor foi admitido pela Eternit em janeiro de 1978 e trabalhou para a empresa durante 25 anos. Aposentado, recontratado, por meio de empresa, e depois dispensado sem justa causa, ele propôs ação trabalhista pleiteando reconhecimento de vínculo durante todo o tempo trabalhado, verbas rescisórias, adicional de insalubridade e indenização por danos morais e materiais.
Segundo contou na inicial, ele adquiriu doença profissional pelo contato permanente com amianto. Disse que ficou cerca de um ano internado em hospital, tendo que realizar cirurgia para retirar parte do pulmão, contaminado pelo agente nocivo.
A empresa, por sua vez, negou o dano. Disse que o amianto é um mineral “natural, presente em mais de 2/3 da superfície terrestre e cujas fibras são respiradas em qualquer localidade do planeta em razão da disseminação”, não sendo possível afirmar que a doença desenvolvida pelo vendedor era proveniente do ambiente de trabalho. Por fim, alegou que o empregado era fumante, por mais de 30 anos, o que teria sido a provável causa de sua doença.
Provas periciais
A Vara do Trabalho, ao examinar o caso, reconheceu o vínculo empregatício, concedeu as verbas rescisórias, porém negou os pedidos referentes aos danos morais e materiais. O juiz tomou por base o laudo pericial realizado no local de trabalho do vendedor, que concluiu pela inexistência de insalubridade, em todo o período trabalhado, tendo em vista que os agentes físicos a que era exposto o trabalhador “não ultrapassavam os limites de tolerância”.
O magistrado, ao sopesar as provas, considerou frágil o laudo médico produzido, no sentido de reconhecer o nexo de causalidade, ainda que por agravamento, entre a exposição do trabalhador ao amianto e a doença por ele desenvolvida. Para o juiz, a conclusão médica foi calcada apenas nas informações fornecidas pelo vendedor, em relação ao tempo de exposição ao amianto.
Alguns fatores contribuíram para a conclusão do julgador: o fato do trabalhador realizar serviços externos, “sem contato permanente com o parque fabril da ré”; do laudo médico ter sido baseado em uma fotografia em que o trabalhador aparece ao lado de telhas em loja localizada na cidade de Araçatuba, “documento que não é capaz de comprovar a exposição permanente do autor ao amianto”; e a falta de provas concretas de que “vistoriava habitualmente telhas e caixas d'água quebradas ou mesmo participava ou presenciava o recorte destes produtos nas empresas visitadas”.
Para o magistrado, ao contrário do que concluiu a perícia médica, o grau de contato com o amianto não poderia provocar a doença. E completou: “não há prova de que o profissional (médico) que subscreveu (o laudo) tivesse conhecimento da condição de fumante do paciente”. Por fim, concluiu: “se se considerar que o autor contraiu moléstica em razão da exposição a amianto, então os vendedores de todas as lojas que comercializam telhas e caixas d'água estarão contaminados”, disse ele ao negar os pedidos de indenização. O trabalhador, insatisfeito, recorreu ao TRT.
Reviravolta
A conclusão, no Regional, foi diferente. Ao valorizar o laudo médico, e não a perícia no local de trabalho, o colegiado destacou que a não constatação de insalubridade não induz à ausência de dano. “As premissas que acarretam o deferimento dos direitos são distintas”, esclareceu o Regional. Segundo o acórdão do TRT, três pontos são indiscutíveis nos autos: o trabalhador jamais utilizou equipamento de proteção individual, nas ocasiões em que se expunha à poeira de amianto; inalou tal produto por longo período, quase três décadas; e está irremediavelmente doente.
“Se a quantidade de produto inalada não dá direito ao trabalhador ao recebimento do adicional de insalubridade (conclusão, ao que me parece, precipitada, mas que não é objeto de discussão no recurso do reclamante), o mesmo não se diga para o surgimento de doença profissional, adquirida pelo obreiro de forma indene de dúvida, após 25 anos exposto a produto vastamente tóxico e de utilização proibida na maior parte do mundo”, destacou o acórdão.
Ao concluir haver nexo de causalidade entre a doença e a atividade do vendedor, o TRT concedeu ao trabalhador indenização por dano moral de R$ 300 mil, mais pensão vitalícia no valor de cinco salários mínimos mensais. Dessa vez, a irresignação foi da empresa, que recorreu ao TST.
Decisão do TST
A ministra Maria de Assis Calsing, relatora, ao receber o recurso de revista, esclareceu que a discussão envolve valoração de provas – de um lado, a conclusão da Vara que indeferiu o pedido mediante rejeição das conclusões periciais; de outro, o Regional, que concluiu, com base nas informações da perícia, que o empregado teve sua saúde comprometida por causa da exposição ao amianto.
Segundo a ministra, se TRT concluiu que a longa exposição ao amianto foi causa da doença do vendedor, conclusão em contrário somente seria possível com reapreciação das provas, o que não é possível na atual instância recursal, conforme a Súmula 126 do TST, que estabelece: “Incabível o recurso de revista ou de embargos para reexame de fatos e provas”. O recurso da empresa não foi provido, mantendo-se a decisão do Regional que concedeu os pedidos de indenização ao trabalhador.